Elementos
fundamentais para a crítica da economia política
Formas
que precedem a produção capitalista
Sobre
o processo que precede à formação da relação de capital ou à
acumulação originária.
Karl
Marx
Grundrisse,
1857-1958, Paginas 475 a 413
Originais:
Karl
Marx. Grundrisse der Kritik Politischen Okonomie
(Roentwurf).1857-1858. Pg 475-413.
Elementos
Fundamentales para la critica de la economia política (Borrador)
1857-1858 Volumen I. Buenos aires: Siglo veinteuno, 1973. Pg 433-477.
Tradução:
Carlos Alberto Feitosa
Perim, Vitória, 2012
Dizem que Marx é
difícil. Não é não.
Para verificar é só
ler esse texto
onde Marx nos explica
facilmente entre outras coisas:
como surgiu o trabalho
e o capital
a entidade comunitária
originaria
a formação da
relação de capital, etc.
Gratificante
Para os jovens do
Brasil como Nuno meu filho.
Marx queria ser claro e
simples para pessoas simples
Fiz
esta tradução pensando nisso.
será
que consegui?
....
Carlos Alberto Feitosa
Perim
2ager
publicus, terra pública.
Formas
que precedem a produção capitalista:
Sobre
o processo que precede à formação da relação de capital ou à
acumulação originária.
Se
um pressuposto do trabalho assalariado e uma das condições
históricas do capital é o trabalho livre e a troca desse trabalho
livre por dinheiro a fim de reproduzir e valorizar o dinheiro, a fim
de ser consumido pelo dinheiro como valor de uso, não para o
desfrute mas como valor de uso para o dinheiro, do mesmo modo, outro
pressuposto é a separação do trabalho livre, com relação às
condições objetivas de sua realização, com relação ao meio de
trabalho e ao material de trabalho. Portanto, sobretudo, separação
do trabalhador com relação à terra como seu laboratório1
natural - e, por conseguinte, dissolução da pequena propriedade da
terra, assim como também da propriedade coletiva da terra baseada na
comuna oriental. Sob essas duas formas o trabalhador se comporta com
as condições objetivas de seu trabalho como com sua propriedade:
estamos ante a unidade do trabalho com seus pressupostos materiais.
Por conseguinte, o trabalhador tem uma existência objetiva,
independente do trabalho. O indivíduo se comporta consigo mesmo como
proprietário, como senhor das condições de sua realidade. Se
comporta do mesmo modo com o outro e, conforme este pressuposto
esteja
posto como derivado da entidade comunitária ou das famílias
individuais que constituem a comunidade, se comporta com os outros
como com co-proprietários, como com tantas outras encarnações da
propriedade comum, ou como com proprietários autônomos, junto aos
quais a própria propriedade comum, que antes de tudo o absorvia e
dominava, é posta como um particular terreno
público2
diferenciado, junto aos muitos proprietários da terra.
Em
ambas as formas, os indivíduos não se comportam como trabalhadores
mas sim como proprietários - e membros de uma entidade comunitária
em que ao mesmo tempo trabalham. O objetivo deste trabalho não é a
criação
de valor
- ainda quando é possível que se execute trabalho excedente para
trocá-lo por produtos alheios, isto é, por produtos excedentes -
mas seu objetivo é a manutenção do proprietário individual e de
sua família assim como da entidade comunitária global. O colocar ao
indivíduo como trabalhador, nesta nudez, é em si mesmo um produto
histórico.
1Laboratorium.
Na
primeira destas formas de propriedade da terra, aparece, sobretudo,
como primeiro pressuposto uma entidade comunitária resultante de um
processo natural. A família ou a família que tornou-se tribo, por
ampliação ou por casamentos mistos entre famílias, ou uma
combinação de tribos.Dado que se pode admitir, que a vida
pastoral,
ou mais em geral o nomadismo,
constitui a primeira forma dos modos de existência, na qual a tribo
não se instala em uma sede determinada mas aproveita para a pastagem
o que vai encontrando pois os homens não são por natureza
sedentários (para isso deveriam encontrar-se em um âmbito natural
tão especialmente fértil para que se estabelecessem nele igual aos
monos numa árvore; ao não ocorrer isto, andarão vagabundeando1
como as bestas selvagens), por conseguinte, a coletividade
tribal,
a entidade comunitária natural, não aparece como resultado
mas como pressuposto
da apropriação coletiva
(temporária) do
solo e de sua utilização.
Quando finalmente se acena, o que esta coletividade originária se
modifique em maior ou menor grau dependerá tanto de diversas
condições externas, climáticas, geográficas, físicas, etc., como
de sua particular disposição natural, etc.: de seu caráter tribal.
A coletividade tribal resultante de um processo natural, ou, se se
quer, a horda - a comunidade de sangue, de idioma, de costumes, etc.
- é o primeiro pressuposto da
apropriação das condições objetivas
de sua vida e da atividade de auto reprodução e de objetivação
desta (atividade como pastores, caçadores, agricultores, etc.). A
terra é o grande laboratorium,
o arsenal, que proporciona tanto o meio de trabalho como o material
de trabalho como também a sede, a base
da entidade comunitária. Os homens se comportam com ela
ingenuamente, tratando-a como propriedade da entidade comunitária,
da entidade comunitária que se produz e reproduz por meio do
trabalho vivo. Cada indivíduo se comporta como proprietário
ou
possuidor
só enquanto membro desta comunidade. A apropriação
real
por meio do processo de trabalho ocorre sob estes pressupostos, os
quais não são eles mesmos produto do trabalho, mas aparecem como os
pressupostos naturais ou divinos
deste. Contando sempre com esta relação como base, esta forma pode
realizar-se de maneiras muito diversas. Por exemplo, de nenhum modo
esta em contradição com ela o que, tal como na maior parte das
formas fundamentais asiáticas,
a unidade omnicompreensiva,
que está por cima de todas estas pequenas entidades comunitárias,
apareça como o proprietário
superior ou como o único
proprietário,
de tal modo que as comunidades efetivas só apareçam como
possuidores hereditários.
Dado que a unidade
é o proprietário efetivo e o pressuposto efetivo da propriedade
coletiva, esta mesma pode aparecer como algo particular por cima de
muitas entidades comunitárias particulares e efetivas e, por
conseguinte, o indivíduo resulta nelas desprovido de fato2
de propriedade, ou a propriedade - isto é o comportamento do
indivíduo com as condições naturais
do trabalho e da reprodução como com condições que lhe pertencem,
objetivas, que são para ele o corpo de sua subjetividade pré
existente como natureza inorgânica - aparece mediada para ele por
uma franquia que a unidade global - unidade que se realiza no déspota
como pai das muitas entidades comunitárias - outorga ao indivíduo
por intermédio da comunidade particular. O produto excedente que
além disso se vê determinado legalmente como consequência da
apropriação efetiva por meio do trabalho - pertence então , em
si, a esta unidade suprema. Portanto, em meio do despotismo oriental
e da carência de propriedade que parece existir juridicamente nele,
existe de fato como fundamento, esta propriedade comunitária ou
tribal, produto sobretudo de uma combinação de manufatura e
agricultura dentro da pequena comunidade, que desse modo torna-se
inteiramente autossuficiente3
e contém em si mesma todas as condições da reprodução e da
coletividade superior, em última instância existe como pessoa,
e este trabalho excedente se faz efetivo tanto em tributos, etc.,
como no trabalho comum destinado a exaltar à unidade, em parte ao
déspota real, em parte a entidade tribal imaginada, ao deus. Este
tipo de propriedade comunitária, enquanto se realiza realmente no
trabalho, pode por sua vez aparecer de duas maneiras: por um lado, as
pequenas comunidades podem vegetar independentemente uma ao lado da
outra e nelas o indivíduo trabalha independentemente, com sua
família, no lote que lhe foi reservado (um trabalho determinado para
reservas coletivas, por assim dizê-lo para seguro4,
por um lado, e para custear
os gastos da entidade comunitária em quanto tal,
ou seja para a guerra, para o serviço divino, etc.; o dominium
senhorial em seu sentido mais originário se encontra primeiramente
aqui, por exemplo, nas comunidades eslavas, nas romanas, etc. Aqui se
dá a transição para a prestação pessoal, etc.), ou, por outro
lado, a unidade pode estender-se até incluir também o caráter
coletivo do trabalho mesmo, o qual pode constituir um sistema
formalizado como no México, em especial no Peru, entre os antigos
celtas, algumas tribos da Índia. Também, o caráter coletivo, pode
estar presente na tribo de modo que a unidade esteja representada por
um chefe da família tribal ou como a relação recíproca entre os
pais de família. Segundo esta, a entidade comunitária terá uma
forma mais despótica ou mais democrática. Por conseguinte, as
condições coletivas da apropriação real por meio do trabalho, por
exemplo, sistemas
de regadio,
muito importantes entre os povos asiáticos, meios de comunicação,
etc., aparecem como obra da unidade superior, do governo despótico
que flutua por cima das pequenas comunidades. Neste caso as cidades
propriamente ditas surgem junto a estas aldeias só naquele ponto que
é particularmente favorável para o comércio com o exterior ou ali
onde o governante e seus sátrapas intercambiam seus ingressos
(produtos excedentes) por trabalho, gastam esses ingressos como
fundos-de-trabalho5.
3self-sustaining
4insurance
5 labour-funds,
A
segunda forma - a qual, como a primeira deu lugar a modificações
essenciais, historicamente, etc. -, produto de uma vida histórica
mais dinâmica, dos destinos e das modificações das tribos
originárias, tem também como primeiro pressuposto a entidade
comunitária,
mas não como no primeiro caso enquanto substância, da qual os
indivíduos são meros acidentes ou em relação à qual só
constituem componentes naturais; tampouco supõe a terra como base,
mas a
cidade
como sede já desenvolvida (centro)1
dos camponeses (proprietários da terra). A terra de cultivo aparece
como terra da cidade, não mais a aldeia (vila) como mero acessório
da terra. A terra em si - e não importa que dificuldades ofereça
para seu lavoreio, para sua apropriação real - não oferece
obstáculos para comportar-se com ela como com a natureza inorgânica
do indivíduo vivo, como sua
oficina2,
como com o meio de trabalho, objeto de trabalho e meio de vida do
sujeito. As dificuldades que encontra a comunidade só podem provir
de outras comunidades, que já ocuparam essa terra ou que molestam à
comunidade em sua ocupação. A guerra
é então a grande tarefa comum, o grande trabalho coletivo,
necessário para ocupar as acondiçoes objetivas da existência vital
ou para proteger e eternizar a ocupação das mesmas. Portanto, a
comunidade composta de famílias se organiza, em primeiro lugar para
a guerra - como organização militar e guerreira -, e esta é uma
das condições de sua existência como proprietária.
A concentração de habitações na cidade é base desta organização
guerreira. A natureza da organização tribal leva por si mesma à
constituição de linhagens superiores e inferiores, diferenciação
esta que se desenvolve ainda mais pela mistura com tribos subjugadas,
etc. A propriedade comunitária como propriedade estatal - terreno
público3
- se vê neste caso separada da propriedade privada. A propriedade do
indivíduo não é aqui imediatamente e de por si propriedade
comunitária, com no primeiro caso4,
onde, por sua vez, tampouco é propriedade do indivíduo separado da
comunidade pois este é sim somente seu possuidor. Quanto menor seja
o grau em que a propriedade do indivíduo só possa ser valorizada,
de fato, por meio do trabalho comum - como por exemplo no Oriente
pelas valas5
-, quanto maior seja o grau em que por meio de migrações, por meio
do movimento histórico, se haja quebrado o caráter natural da
tribo, quanto mais se distancie a tribo de sua sede original e ocupe
terra alheia
e entre, portanto, em condições de trabalho essencialmente novas,
com um maior desenvolvimento da energia do indivíduo - seu caráter
comum aparece e deve aparecer para fora sobretudo como unidade
negativa -, tanto mais estão dadas as condições para que o
indivíduo se converta em proprietário
privado
do solo, de parcelas particulares cujo lavoreio particular o
corresponde a ele e à sua família. A comunidade - como estado - é,
por um lado, a relação recíproca entre esses proprietários iguais
e livres, seu vínculo contra o exterior, e é, ao mesmo tempo, sua
garantia. A natureza desta entidade comunitária se baseia aqui no
fato de que seus membros são agricultores de parcelas, proprietários
da terra que trabalham, e, em igual medida, a autonomia destes
resulta de sua relação recíproca enquanto membros da comunidade,
da salvaguarda do terreno
público6
para as necessidades coletivas e para a gloria coletiva, etc. Neste
caso, segue sendo pressuposto para a apropriação do solo o ser
membro da comunidade, mas, enquanto membro da comunidade, o indivíduo
é proprietário privado. Se relaciona com sua propriedade enquanto
esta é o solo, mas, ao mesmo tempo, enquanto esta é seu ser como
membro da comunidade, e a manutenção de si mesmo como membro é
igualmente a manutenção da comunidade e vice-versa, etc. A
comunidade , embora seja aqui um produto
histórico
não só de fato - mas também como algo reconhecido como tal e que
portanto tem
uma origem,
é pressuposto
da propriedade
do solo - quer dizer da relação entre o sujeito que trabalha e os
pressupostos naturais do trabalho, dados como algo que o pertence - ,
porem este pertencimento é mediado por seu ser membro do estado,
pelo ser do estado e, portanto por um pressuposto
que é pensado como divino, etc. Concentração na cidade, com o
campo como território; economia camponesa em pequena escala, que
trabalha para o consumo imediato: manufatura como atividade doméstica
acessória das mulheres e filhas (fiar e tecer) ou independentes em
alguns ramos específicos (fabri: artesões, mais em particular
artesão que trabalham com metais, etc.). O pressuposto da perduração
desta organização comunitária é a manutenção da igualdade entre
seus camponeses-autosuficientes7
livres e o trabalho próprio como condição para a perduração de
sua propriedade. Os indivíduos se comportam com as condições do
trabalho como proprietários , mas, em realidade,estas condições
ainda devem ser postas constantemente pelo trabalho pessoal como
condições e elementos objetivos da personalidade do indivíduo. Por
outro lado, a orientação desta pequena comunidade guerreira a
empurra para além destes limites, etc. (Roma, Grécia, judeus, etc.)
"Uma vez que os presságios", disse Niebuhr, "o
asseguraram a Numa a apropriação divina de sua eleição, a
primeira preocupação do piedoso rei não foi o serviço do templo
mas sim o dos homens. Dividiu, as terras que Rômulo havia ganho na
guerra e havia deixado para que fossem ocupadas: instaurou o culto de
Término. Todos os legisladores antigos, e sobretudo Moisés,
fundaram o êxito de seus preceitos em favor da virtude, da retidão
e a favor dos bons costumes sobre a propriedade da terra ou, pelo
menos, sobre a posse hereditária segura da terra para o maior número
possível de cidadãos"8
. O indivíduo é colocado em condições tais para ganhar sua vida
que seu objetivo não é a aquisição de riqueza mas a subsistência,
sua própria reprodução como membro da comunidade; sua própria
reprodução como proprietário da parcela e, em tal caráter, como
membro da comuna. A perduração da comuna é a reprodução de todos
os membros da mesma como produtor de riqueza9,
cujo trabalho excedente, o trabalho da guerra, etc., pertence
igualmente à comunidade. A propriedade do próprio trabalho é
mediada por meio da propriedade da condição do trabalho - da
parcela de terra, por sua vez garantida por meio da existência da
comunidade, e esta por sua vez por meio do trabalho excedente sob a
forma de serviço guerreiro, etc., dos membros da comunidade. O
membro da comunidade não se reproduz por meio da cooperação no
trabalho produtor de riqueza, mas sim por meio da cooperação no
trabalho para os interesses coletivos (reais ou imaginários) ligados
à manutenção do nexo10
para fora e para dentro. A propriedade é quiritária, romana, o
proprietário privado da terra só o é como romano, mas como romano
é proprietário privado da terra.
1"Sitz"
(sede).
3ager publicus, terra pública.
4case
5acequias
6ager publicus, terra pública.
7self-sustaining peasants
8Niebuhr. Vol. I, 245, 2a. ed.,Hist.Rom
9self-sustaining peasants
10vínculo
Uma
(terceira) forma da propriedade das condições naturais de seu
trabalho por parte dos indivíduos que trabalham, membros auto
suficientes da comunidade1,
é a germânica. Neste caso não ocorre como na forma especificamente
oriental, na qual o membro da comunidade é como tal coproprietário
da propriedade coletiva (onde a propriedade só
existe
como propriedade da terra, o membro individual como tal é só
possuidor
de uma parte específica, hereditária ou não, pois a ninguém
pertence per si uma fração de propriedade, a não ser como membro
imediato da comunidade, enquanto está em unidade direta com ela e
não quando se diferencia dela. Por conseguinte, este indivíduo2,
é só possuidor. Só existe propriedade coletiva
e unicamente
possessão privada.
Os modos desta possessão em relação com a propriedade coletiva
podem modificar-se por completo histórica e localmente, etc.,
conforme o próprio trabalho ocorra a cargo do possuidor privado
isolado ou, por sua vez, esteja determinado pela comunidade ou pela
unidade situada por cima das comunidades particulares). Tampouco
ocorre como na forma grega, romana (em suma, na forma antiga
clássica) na qual aterra é ocupada pela comunidade e é solo
romano: uma parte corresponde à comunidade como tal, enquanto
diferente de seus membros, terreno
público3
em suas diversas formas, a outra parte é dividida e cada parcela é
romana enquanto é a propriedade privada, o domínio, de um romano, a
parte que lhe pertence do laboratório, mas, também (a su vez), ele
só é romano enquanto possui direito soberano sobre uma parte da
terra romana.
Na
antiguidade, o comércio e os ofícios urbanos eram pouco apreciados,
enquanto a agricultura era altamente respeitada; na Idade Média, a
evolução oposta. O direito ao usufruto da terra comunitária por
meio de sua possessão os correspondia originariamente ao patrícios;
estes logo se o outorgaram a seus clientes; a transferência
em propriedade de
terras do terreno
público4
as correspondeu exclusivamente aos plebeus: todas as atribuições
em favor dos plebeus e compensação por uma parte da terra
comunitária. Propriedade
territorial propriamente dita,
com exceção da situada ao pé dos muros da cidade, originariamente
só em mãos de plebeus (comunidades rurais logo absorvidas. Caráter
essencial da plebe romana com um conjunto de camponeses, tal como se
põe de manifesto em sua propriedade quiritária. Os antigos
consideravam unanimemente o trabalho da terra como a ocupação
própria do homem livre, a escola dos soldados. ali está contida a
antiga cepa da nação, que se modifica nas cidades, onde se
estabelecem artesãos e comerciantes estrangeiros e onde também
chegam os nativos atraídos pela ganancia. Onde existe escravidão, o
liberto busca sua subsistência por meio de tais ocupações, nas
quais geralmente reúne riquezas: de tal modo, também na Antiguidade
esses ofícios se encontravam sobretudo em suas mãos e, por
conseguinte, não eram decorosos para o cidadão: daí a opinião de
que seria perigoso outorgar aos artesãos a cidadania plena (por
regra geral, entre os antigos gregos estavam excluídos dela).
A
nenhum romano estava permitido dedicar-se ao comércio ao varejo ou
ser artesão.
3ager publicus, terra pública.
4ager publicus, terra pública.
Os
antigos não tinham nem sequer vagamente a ideia da dignidade própria
para a organização corporativa, tal como esta aparece na história
das cidades medievais, e inclusive nestas, enquanto as corporações
venceram às linhagens, o espírito militar declinou por completo e,
por conseguinte, também o respeito pela cidade fora dela e sua
liberdade. As tribos dos estados antigos estavam constituídas de
duas maneiras: sobre a base de
linhagens
ou sobre a base de lugares.
As tribos baseadas
em linhagens,
superam em antiguidade às tribos baseadas no lugar e em quase todas
as partes foram suplantadas por estas. Sua forma mais estrita, mais
estrema, é a organização de castas, separadas umas das outras, sem
direito a matrimônio misto e inteiramente diferenciadas enquanto à
sua dignidade, correspondendo-lhe a cada uma um ofício exclusivo e
imutável. As tribos
locais
corresponderam originariamente a uma divisão da terra em distritos e
aldeias (vilas), de tal modo que, no Atica sob Clístenes, aquele que
no momento da divisão se encontrava em uma aldeia foi registrado
como um demotes1
dessa aldeia, membro da phylé2
da região a qual pertencia a aldeia. A regra era que, de aí em
diante, seus descendentes, sem que importara seu lugar de residência,
ficarão na mesma phylé
e o mesmo demos,
com o que também esta divisão assumiu uma aparência de parentesco.
A linhagem romana3
não
era um parentesco de sangue: "descendência de homens livres".
Os Santuários
comuns4
dos gentis5
romanos desapareceram mais tarde (já em tempos de Cícero). O que se
manteve mais tempo foi a herança conjunta dos membros da linhagem
mortos sem parentes e sem testamento. Nos tempos mais antigos, os
membros das gens
tinham a obrigação de ajudar a suportar cargas extraordinárias
àqueles dos seus necessitados de assistência. (Entre os germanos
isto se dá desde suas origens e em todas partes; máxima
persistência entre os ditmarsos6).
As gentes7,
corporações. No mundo antigo não existiu nenhuma organização
mais geral que as linhagens. Assim entre os gauleses, os
aristocráticos Campbells se seus vassalos constituem um clã.
Dado que o patrício representa em maior grau a entidade comunitária,
ele é o possuidor
do terreno
público8
e o utiliza por intermédio de seus clientes, etc. (e também vai-se
apropriando dele gradualmente). A comunidade germânica não se
concentra na cidade; a mera concentração - a cidade
como centro da vida rural, domicílio dos trabalhadores da terra e
igualmente centro da condução da guerra.
Outorga então à comunidade como tal uma existência externa,
diferente da do indivíduo. A história antiga clássica é história
urbana, mas de cidades baseadas sobre a propriedade da terra e a
agricultura: a história asiática é uma espécie de unidade
indiferente de cidade e campo (neste caso as cidades verdadeiramente
grandes devem ser consideradas meramente como acampamento senhorial,
como superfetação sobre a estrutura propriamente econômica); a
Idade Média (época germânica) surge da terra como sede da
história, história cujo desenvolvimento posterior se converte logo
em uma contraposição entre cidade e campo; a história moderna é
urbanização do campo, não, como entre os antigos, ruralização da
cidade.
Como
resultado da concentração na cidade, a comunidade como tal possui
uma existência econômica; a
mera existência da cidade como tal é diferente da mera pluralidade
de casas independentes.
Neste
caso, o todo não consiste em suas partes. É uma espécie de
organismo autônomo.
Entre os germanos, entre quem os cabeças de família se estabelecem
nos bosques, separados por grandes distâncias, a comunidade somente
existe, considerada só externamente,
em virtude de cada ato de reunião de seus membros, ainda quando sua
unidade existente
em si
mesma
está posta na ascendência, a língua, o passado e a história
comuns, etc. Em consequência a comunidade
aparece
como uma reunião,
não como uma
união,
como acordo entre sujeitos autônomos que são os proprietários da
terra, não como unidade. Por isso a comunidade não existe de
fato9
como estado,
como entidade
estatal,
tal como entre os antigos, porque não existe como cidade.
Para que a comunidade adquira uma existência real, os proprietários
livres da terra devem reunir-se em assembleia, enquanto que em Roma,
por exemplo, a comunidade existe, fora destas assembleias, na
presença da própria
cidade e
dos funcionários que estão a sua frente, etc. Sem dúvida, se dá
também entre os germanos o terreno
público10,
a terra comunitária ou terra do povo, diferenciada da propriedade do
indivíduo. Se trata da terra de caça, pradarias, reservatórios de
lenha, daquela parte da terra que não pode ser dividida se é que há
de prestar serviços como meio de produção nesta forma determinada.
Contudo este terreno
público11
não aparece, como entre os romanos, por exemplo, como a existência
econômica particular do estado paralelamente aos proprietários
privados, de tal modo que estes proprietários privados são tais
enquanto estavam excluídos, estavam privados, tal como os plebeus,
do usufruto do terreno
público12.
Entre os germanos, o terreno
público13
aparece, bastante, só como uma ampliação da propriedade privada
individual e só figura como propriedade enquanto possessão comum de
uma tribo pela qual há que lutar contra tribos inimigas. A
propriedade do indivíduo não aparece mediada pela comunidade, mas a
existência da comunidade e da propriedade comunitária aparecem
mediadas, quer dizer, como relação recíproca dos sujeitos
autônomos. No
fundo14
o todo econômico está contido em cada casa individual, a qual
constitui para si um centro autônomo da produção (manufatura só
como ocupação doméstica acessória das mulheres, etc.). No mundo
antigo, a cidade com suas terras vizinhas é o todo econômico; no
mundo germânico, o domicílio individual, que só aparece como um
ponto na terra que lhe pertence; não uma concentração de muitos
proprietários, mas uma família com unidade autônoma. Na forma
asiática (pelo menos na predominante), não há propriedade, mas só
possessão por parte do indivíduo; a comunidade é propriamente o
proprietário efetivo, por conseguinte, propriedade só como
propriedade
coletiva do
solo. Entre
os antigos (os romanos como o exemplo mais clássico, a coisa na
forma mais pura, mais delineada), se dá a forma contraposta da
propriedade estatal e a propriedade privada, de tal modo que esta
existe mediada por aquela ou a própria estatal existe nesta forma
dupla.
Por conseguinte, o proprietário privado é ao mesmo tempo cidadão
urbano. Do ponto de vista econômico, a cidadania estatal se reduz à
forma simples do camponês habitante de uma cidade. Na forma
germânica, o camponês não é cidadão do estado, quer dizer, não
é habitante da cidade, mas o fundamento é a vivenda familiar
autônoma, isolada, garantida por meio de sua associação com outras
vivendas familiares similares da mesma tribo, e por meio de sua
reunião ocasional para a guerra, a religião, a resolução de
problemas legais, de tarefas tais que afiancem a segurança mútua.
A propriedade individual da terra não aparece aqui como forma
contraposta à propriedade comunitária, nem tampouco como medida
através desta, mas ao inverso. A comunidade só existe na relação
recíproca entre estes proprietários individuais da terra, enquanto
tais. A propriedade comunitária enquanto tal só aparece como um
completo comunitário das ridências individuais da tribo e das
apropriações individuais do solo. A comunidade não é a substância
com relação à qual o indivíduo aparece só como acidente, nem
tampouco o geral que, enquanto tal, seja uma unidade
existente como
representação e simultaneamente como presença da cidade e de suas
necessidades urbanas diferenciadas das do indivíduo, ou como solo
urbano, enquanto existência particular da cidade, a diferença da
existência econômica particular do membro da comunidade. Ao
contrário, a comunidade em si, como comunidade na língua, no
sangue, etc., é algo que, por um lado, constitui um pressuposto do
proprietário individual, mas, por outro lado, como existência só
se dá em sua reunião
efetiva
para
objetivos comuns e, na medida em que tem uma existência econômica
particular por meio do uso em comum de zonas de caça, pradarias,
etc., estas são utilizadas por cada proprietário individual em
quanto tal, não (como em Roma) enquanto representante do estado;
propriedade efetivamente comum dos proprietários individuais, não
da associação destes proprietários, que possuiria na própria
cidade uma existência separada da de cada um como proprietário
individual.
A
questão é propriamente a seguinte: em todas estas formas nas quais
a propriedade da terra e a agricultura constituem a base da ordem
econômica e, por conseguinte, o objetivo econômico é a produção
de valores de uso, a
reprodução do indivíduo
naquelas relações determinadas com sua comunidade nas quais ele
constitui a base desta, em todas essas formas há: 1) apropriação
da condição natural do trabalho
- da terra como instrumento originário de trabalho e simultaneamente
como laboratorium, como reservatório de matérias primas - não por
meio do trabalho, mas como pressuposto do trabalho. O individuo se
comporta com as condições objetivas do trabalho simplesmente como
com algo seu, se comporta com elas tratando-as como natureza
inorgânica de sua subjetividade, na qual esta se realiza a si mesma;
a principal condição objetiva do trabalho não se apresenta como
produto
do trabalho, mas que se faz presente como natureza;
por um lado, se dá o indivíduo vivente, pelo outro, a terra como
condição objetiva da reprodução deste; 2) Mas este comportamento
com o solo, com a terra, tratando-o como propriedade do indivíduo
que trabalha - o qual, em consequência, já desde um princípio não
aparece, nesta abstração, como mero indivíduo que trabalha, mas
que tem na propriedade da terra um modo
objetivo de existência,
que constitui o pressuposto
de
sua atividade, tal como sua pele, seus órgãos dos sentidos, aos
quais sem dúvida também reproduz no processo vital, e os
desenvolve, etc., mas que, por seu lado, constituem um pressuposto
desse processo de reprodução - , este comportamento está
igualmente mediado por meio da existência natural, em maior ou menor
grau desenvolvida historicamente e modificada, do indivíduo como
membro
de uma comunidade,
ou seja por meio de
sua existência natural como membro de uma tribo,
etc. Assim como um indivíduo isolado não poderia ter linguagem,
tampouco poderia ter propriedade do solo. Quanto mais, poderia
nutrir-se dele como substância, igualmente aos animais. O
comportamento em relação à terra como propriedade é sempre
mediado pela ocupação, pacífica ou violenta, da terra pela tribo,
pela comunidade em qualquer de suas formas em maior ou menor grau
naturais ou já resultado do desenvolvimento histórico. Neste caso,
o indivíduo nunca pode fazer-se presente na forma puntual com que
aparece enquanto mero trabalhador livre. Se as condições objetivas
de seu trabalho estão pressupostas como membro de uma comunidade,
por meio da qual é mediada sua relação com o solo. Sua relação
coma as condições objetivas do trabalho é mediada por sua
existência como membro da comunidade; por outro lado, a existência
efetiva da comunidade está determinada pela forma determinada de sua
propriedade das condições objetivas do trabalho. Que esta
propriedade mediada pela existência na comunidade apareça como
propriedade
coletiva,
na qual o indivíduo só seja possuidor e não se dê propriedade
privada alguma do solo, ou que a propriedade apareça na dupla forma
de propriedade estatal e privada, uma junto à outra, de tal modo que
esta última se apresente como posta pela primeira, e, em
consequência só o cidadão do estado possa e deva ser proprietário
privado, mas, por outro lado, sua propriedade como cidadão do estado
tenha, ao mesmo tempo, uma existência particular, ou que,
finalmente, a propriedade comunal apareça só como ampliação da
propriedade individual, mas esta se apresente como a base e a
comunidade em geral não tenha existência para si fora da assembleia
dos membros e de sua associação para objetivos comuns, estas
diversas formas de comportamento dos membros da comunidade ou tribo
com relação ao solo da tribo - a terra na qual se estabeleceu -
dependem em pare das condições econômicas sob as quais este se
comporta com o solo como proprietário, quer dizer, sob as quais se
apropria pelo trabalho dos frutos deste, o qual, por sua vez,
dependerá do clima, das características físicas do solo, do modo
fisicamente condicionado de sua exploração, de seu trato com as
tribos inimigas ou vizinhas e das mudanças produzidas pelas
migrações, experiências históricas, etc. Para que a comunidade
siga existindo segundo o modo antigo, como tal, é necessária a
reprodução de seus membros sob as condições objetivas
pressupostas. A própria produção, o progresso da população (a
qual também pertence ao âmbito da produção) suprimem gradualmente
e necessariamente estas condições; as destroem em vez de
reproduzi-las, etc., e desse modo se desintegra a entidade
comunitária junto com as condições de propriedade em que estava
baseada. A forma asiática é necessariamente a que se mantém com
maior persistência e duração. Isto está implícito em seus
pressupostos: que o indivíduo não chega a ser independente da
comunidade, que há um círculo auto sustentável15
da produção, uma unidade da agricultura e a manufatura, etc. Se o
indivíduo muda sua relação com a comunidade, muda desse modo à
comunidade e atua em forma destrutiva sobre ela, assim como sobre seu
pressuposto econômico; por outro lado, a mudança deste suposto
econômico, provocado por sua própria dialética, empobrecimento,
etc. Em especial a influência da organização guerreira e a
conquista, que em Roma, por exemplo, é essencialmente parte das
condições econômicas da própria comunidade, destrói o vínculo
real sobre o qual esta se baseia. Em todas estas formas, a reprodução
das
relações pressupostas
entre o indivíduo e sua comunidade - relações em maior ou menor
grau naturais ou produto de um processo histórico, porém
tradicionais - e de uma existência objetiva
determinada,
para ele predeterminada,
tanto com relação às condições do trabalho como com relação a
seus companheiros de trabalho e de tribo, é o fundamento do
desenvolvimento, que, em consequência, é doravante um
desenvolvimento
limitado,
mas que, ao trazer a superação dos limites, representa decadência
e ruína. O desenvolvimento da escravidão, a concentração da
propriedade da terra, o intercâmbio, o sistema monetário, a
conquista, etc., atuaram assim entre os romanos ainda quando todos
estes elementos pareceram compatíveis com o fundamento e pareceram
em parte ampliações inofensivas deste, em parte excessos derivados
do mesmo. Podem dar-se aqui grandes desenvolvimentos dentro de um
âmbito determinado. Os indivíduos podem aparecer como grandes. Mas
não há que pensar aqui em um desenvolvimento livre e pleno, nem do
indivíduo, nem da sociedade, pois tal desenvolvimento está em
contradição com a relação originária.
1
Membro de um demos, circunscrição territorial básica.
3Ou, estas linhagens romanas na edição de 1939.
4Sacras.
5Membros da gens ou grupo teoricamente consanguíneo que constituía a unidade social básica.
6Habitantes de uma zona de Holstein, no atual estado de Schleswig Holstein
7Plural de gens
8ager publicus, terra pública.
9In fac
10ager publicus, terra pública.
11ager publicus, terra pública.
12ager publicus, terra pública.
13ager publicus, terra pública.
14Au fond
15self-sustaining
Nunca
encontraremos entre os antigos uma investigação acerca de qual
forma da propriedade da terra , etc., é a mais produtiva, cria a
maior riqueza. A riqueza não aparece como objetivo da produção,
ainda que Catão pudesse investigar qual cultivo do campo é o mais
lucrativo, ou Bruto emprestar dinheiro ao melhor juro. A investigação
versa sempre acerca de qual modo aparece como fim em si mesmo entre
os poucos povos comerciantes – monopolistas do comércio
itinerante1
- que vivem nos poros do mundo antigo, tal como os judeus na
sociedade medieval. A riqueza é aqui, por um lado, coisa, algo
realizado em coisas, em produtos materiais, ao quais se contrapõe o
homem com sujeito; por outra parte, como valor, é mero controle
sobre trabalho alheio, mas não com o objetivo do domínio mas do
gozo privado, etc. Em todas estas formas se faz presente com a
configuração de coisa, trata-se
de uma coisa ou de relação por meio das coisas,
que reside fora do indivíduo e acidentalmente junto a ele. Por isso,
a concepção antiga segundo a qual o homem, qualquer que seja a
limitada determinação nacional, religiosa ou política em que se
apresente, aparece sempre, igualmente, como objetivo da produção,
parece muito excelsa frente ao mundo
moderno onde a produção aparece como objetivo do homem e a riqueza
como objetivo da produção.
Mas, de fato, despoja-se a riqueza de sua limitada forma burguesa. O
quê é a riqueza senão a universalidade das necessidades,
capacidades, gozos, forças produtivas, etc., dos indivíduos, criada
no intercâmbio universal?
O quê, senão o desenvolvimento pleno do domínio humano sobre as
forças naturais, tanto sobre as da assim chamada natureza como sobre
sua própria natureza? O quê, senão a elaboração absoluta de suas
disposições criadoras sem outro pressuposto que o desenvolvimento
histórico prévio,que converte em objetivo a esta plenitude total do
desenvolvimento, quer dizer ao desenvolvimento de todas as forças
humanas em quanto tais, não medidas com um padrão preestabelecido?
O quê, senão uma elaboração como um resultado da qual o homem não
se reproduz em seu caráter determinado mas que produz sua plenitude
total? Como resultado da qual não busca permanecer como algo que
tornou-se mas que está no movimento absoluto do tornar-se? Na
economia burguesa – e na é poca da produção que a ela
corresponde – esta elaboração plena do interno, aparece como
esvaziamento pleno, esta objetivação universal, como alienação
total, e a destruição de todos os objetivos unilaterais
determinados, como sacrifício do objetivo próprio frente a um
objetivo completamente externo. Por isso o infantil mundo antigo
aparece, por um lado, como superior. Por outro lado, o é em tudo
aquilo em que se busque configuração fechada, forma e limitação
dada. É satisfação desde um ponto de vista limitado, enquanto o
mundo moderno já insatisfeito ou ali onde aparece satisfeito consigo
mesmo é
vulgar.
O
que o Senhor Proudhon chama de a gênese extraeconômica
da propriedade – e por propriedade entende precisamente propriedade
da terra – é a relação pré-burguesa
do
indivíduo com as condições objetivas do trabalho e, sobretudo,
com as – condições objetivas do trabalho - naturais,
pois enquanto o sujeito que trabalha é indivíduo natural,
existência natural, esta primeira condição objetiva de seu
trabalho aparece como natureza, como terra, como seu corpo
inorgânico; ele mesmo não é só corpo orgânico mas também esta
natureza inorgânica enquanto sujeito. Esta condição não é seu
produto, mas algo dado previamente: lhe está pressuposta como
existência natural fora dele. Antes de que analisemos isto mais em
detalhe, agreguemos que o bom Proudhon não só podia, mas que devia,
acusar tanto ao capital
com
ao trabalho
assalariado –
enquanto formas de propriedade – de provir (provenir) de uma gênese
extraeconômica.
Pois a existência das condições objetivas do trabalho como algo
separado do trabalhador, como capital,
e a preexistência para o capitalista do trabalhador como desprovido
de propriedade, como trabalhador abstrato, a troca como se dá entre
valor e trabalho vivo, representam um processo
histórico –
por mais que o capital e o trabalho assalariado mesmo reproduzam esta
relação e a elaborem tanto em seu alcance objetivo como em
profundidade - , um processo histórico que, como temos visto,
constitui a história da gênese do capital e do trabalho
assalariado. Em outras palavras: a gênese
extraeconômica da
propriedade significa apenas a gênese histórica
da
economia burguesa, das formas de produção que alcançam sua
expressão teórica ou ideal por meio das categorias da economia
política. O fato de que a história pré-burguesa, e cada uma de
suas fases, tenha também sua economia e um fundamento
econômico de
seu movimento, é no fundo2
a mera tautologia de que a vida do homem, de uma maneira ou de
outra3,
descansou desde sempre sobre a produção social,
cujas relações chamamos precisamente relações econômicas .
As
condições originárias da produção (ou, o que é o mesmo, da
reprodução de um número crescente de pessoas por meio do processo
natural de ambos os sexos, pois esta reprodução, embora apareça,
por um lado, como apropriação dos objetos pelo sujeito, pelo outro
aparece igualmente como conformação do objetos por um fim
subjetivo, como sujeição dos objetos a esse fim ; transformação
destes objetos em resultados e receptáculos da atividade subjetiva)
originariamente não podem ser elas mesmas produzidas, não podem ser
resultado da produção. O que necessita explicação, ou é
resultado de um processo histórico, não é a unidade
do
homem vivente e atuante, por um lado, com as condições inorgânicas,
naturais, de seu metabolismo com a natureza, pelo outro, e, portanto,
sua apropriação da natureza, mas a separação
entre estas condições inorgânicas da existência humana e esta
existência ativa, uma separação que pela primeira vez é posta
plenamente na relação entre trabalho assalariado e capital. Na
relação de escravidão e servidão esta separação não tem lugar,
mas que uma parte da sociedade é tratada pela outra precisamente
como mera condição inorgânica
e natural
da reprodução desta outra parte. O escravo não está em nenhuma
relação com as condições objetivas de seu trabalho, mas que o
próprio
trabalho,
tanto na forma do escravo como na do servo, é colocado como
condição
inorgânica da
produção dentro da série dos outros seres naturais, junto ao gado
ou como acessório da terra. Em outras palavras: as condições
originárias da produção aparecem como pressupostos naturais, como
condições
naturais de existência do produtor,
exatamente igual que seu corpo vivente, o qual, por mais que ele o
reproduza e desenvolva, originariamente não é posto por ele mesmo
mas que aparece como o
pressuposto de
si mesmo; sua própria existência (corporal) é um pressuposto
natural, que ele não colocou. Estas condições
naturais de existência,
com relação às quais ele se comporta como com um corpo inorgânico
que lhe pertence, são elas mesmas duplas: 1) de natureza subjetiva,
2) de natureza objetiva. O produtor preexiste como membro de uma
família, de uma tribo, de uma tribo no sentido romano, etc. Que logo
por meio da mistura e da oposição com outras toma uma configuração
histórica mente diversa, e como e como tal membro se relaciona com
uma natureza determinada digamos aqui todavia terra, solo) como com a
existência inorgânica de si mesmo, como com uma condição de sua
produção e reprodução. Como membro natural da entidade
comunitária participa da propriedade coletiva e tem uma parte
particular em possessão, assim como, enquanto cidadão romano de
nascimento, tem (pelo menos4)
um direito ideal ao terreno
público5
e um direito real a tal ou qual número de juggera6
de terra, etc. Sua propriedade,
quer dizer a relação com os pressupostos naturais de sua produção
como pertencentes a ele, como
seus,
é mediada por meio do fato de ser ele membro natural de uma entidade
comunitária. (A abstração de uma entidade comunitária na qual os
membros não têm nada de comum, a não ser a linguagem, etc., e
apenas isto, é manifestamente o produto de um estado histórico
muito posterior.) Em relação com o indivíduo é por exemplo claro
que o mesmo se comporta com relação à língua como com sua
própria
língua só enquanto membro natural de uma comunidade humana. A
língua como produto de um indivíduo é um absurdo. Mas na mesma
medida o é a propriedade.
A
língua mesma é tanto o produto de uma entidade comunitária, como,
desde outro ponto de vista, ela mesma é a existência da entidade
comunitária e a existência dessa comunidade enquanto ela mesma
falante. A produção coletiva e a propriedade coletiva, tal como se
apresenta por exemplo no Peru, é manifestamente uma forma
secundária,
introduzida e transmitida por tribos conquistadoras, que conheceram
elas mesmas a propriedade comum e a produção coletiva na forma
antiga e mais simples, tal como aparecem na Índia e entre os
eslavos. Igualmente, a forma transmitida secundária,
introduzida por conquistadores nas tribos conquistadas, que se
encontravam em um nível mais baixo. O aperfeiçoamento e a
elaboração sistemática deste sistema a partir de um centro supremo
mostra uma origem tardia. De igual modo que na Inglaterra o
feudalismo importado alcançou uma forma mais cabada que na França,
onde havia surgido naturalmente. Em tribos pastoras nômades – e
todos os povos pastores são originariamente nômades – a terra, ao
igual que as outras condições naturais aparece com um caráter
ilimitado elemental, por exemplo nas estepes e altiplanes asiáticas.
Se a utiliza para pastagem, etc., é consumida pelos rebanhos, que a
sua vez são base da existência dos povos pastores. Se comportam com
a terra como com sua propriedade, ainda quando nunca fixam essa
propriedade. O mesmo, na terra de caça das tribos selvagens da
América: a tribo considera certa região como sua zona de caça e
reafirma isto pela violência frente a outras tribos ou trata de
expulsar a outras tribos da região que ela mesma reclama. Nas tribos
pastoras nômades, a comunidade está de fato sempre reunida, como
grupo em movimento, caravana, horda, e as formas de super e
subordinação se desenvolvem a partir destas condições deste modo
de vida. Neste caso, do que há apropriação
e reprodução é
de fato do rebanho e não da terra, a qual, não obstante, é sempre
utilizada temporariamente, na forma coletiva, nos pontos elevados. O
único limite que pode encontrar a entidade comunitária em seu
comportamento com as condições naturais da produção – a terra –
(passando já diretamente à consideração dos povos sedentários)
como com condições suas,
é outra entidade
comunitária
que já as reclame como seu corpo inorgânico. Por isso é a guerra
um dos trabalhos mais originários de todas as entidades comunitárias
naturais, tanto para a afirmação da propriedade como para a nova
aquisição desta. (Em verdade podemos aqui contentarmos com falar de
propriedade originária do solo, pois entre os povos pastores a
propriedade dos produtos da terra naturalmente existentes – as
ovelhas por exemplo7
– é ao mesmo tempo propriedade das pradarias que transitam. Em
geral, a propriedade do solo está compreendida à dos produtos
orgânicos deste.) Se ao homem mesmo se o conquista junto com o solo,
como acessório orgânico deste, se o conquista então como uma das
condições da produção e assim surge a escravidão e servidão,
que pronto adultera e modifica a forma originária de toda entidade
comunitária e chega a converter-se em base desta. De tal modo, a
estrutura simples resulta negativamente determinada.
3D'une manière ou d'une autre
4at least
5ager publicus, terra pública.
6Yugada: medida romana de superfície equivalente a 2.500 m².
7f.i: abreviatura de “for instance”
Propriedade
não significa então originariamente senão o comportamento do homem
com suas condições naturais de produção como com condições
pertencentes a ele, suas, pressupostas
juntas com sua própria
existência;
comportamento com elas como com pressupostos
naturais de si mesmo,
que, por assim dizê-lo, só constituem a prolongação de seu corpo.
Não se trata propriamente de um comportamento em relação a suas
condições de produção, senão que ele existe duplamente: tanto
subjetivamente enquanto ele mesmo, como objetivamente nestas
condições inorgânicas naturais de sua existência. As formas
destas condições
naturais da produção
são duplas: 1) sua existência como membro de uma entidade
comunitária; em consequência, a existência desta entidade
comunitária, que em sua forma originária é organização
tribal, organização tribal
modificada em maior ou menor grau; 2) o comportamento com o solo
como com algo que é seu
por intermédio da
comunidade comunitária, como frente a uma propriedade territorial
coletiva que, ao mesmo tempo, é possessão
individual para o
indivíduo ou de tal modo que só se repartem os frutos, mas o solo
mesmo e seu cultivo permanecem em comum. Enquanto as habitações,
etc., mesmo em se tratando dos carros dos
citas1,
sempre aparecem, contudo, em possessão do indivíduo. Uma condição
natural de produção para o indivíduo vivente é seu pertencimento
a uma sociedade
natural, tribo, etc.
Esta já é condição, por exemplo, para sua linguagem, etc. Sua
própria existência produtiva só se dá sob essa condição. Sua
existência subjetiva enquanto tal está condicionada por essa
condição, assim como está por seu comportamento com a terra como
com seu laboratorium.
(Por certo, a propriedade é originariamente móvel,
pois o homem se apropria antes de tudo2
dos frutos disponíveis da terra, o que inclui, entre outras coisas,
aos animais e para ele, em especial, os domesticáveis. Embora mesmo
este estado Ainda que inclusive este estado – caça, pesca,
pastoreio, coleta dos frutos das árvores, etc. - suponha sempre
apropriação da terra, seja para uma residência fixa, seja para a
itinerância3,
seja para pastar os animais, etc.)
A
propriedade significa
então pertencer a uma
tribo (entidade
comunitária) (ter nela existência subjetiva-objetiva) e por
intermédio do comportamento desta entidade comunitária frente à
terra, comportamento do indivíduo com a terra, com a condição
originária da produção - pois a terra é ao mesmo tempo material
em bruto, instrumento, fruto – como com pressupostos
correspondentes a sua individualidade, modos de existência desta.
Reduzimos esta
propriedade ao comportamento frente às condições da produção.
Por que não do consumo, já que originariamente o produzir do
indivíduo se limita ao produzir seu próprio corpo por meio da
apropriação de objetos já prontos, preparados para o consumo pela
própria natureza? Inclusive ali onde só há que encontrar
e descobrir,
isto logo requer esforço, trabalho – e produção (isto é,
desenvolvimento) de certas capacidades por parte do sujeito. Mas
também, os estados em que pode tomar-se o existente sem instrumento
algum (por conseguinte inclusive sem produtos do trabalho já
destinados à produção), sem mudança de forma (que já tem lugar
inclusive no pastoreio), etc., devem considerar-se como estados que
muito rapidamente desaparecem e que em nenhuma parte são normais;
tampouco como estados originários normais. Em outros casos, as
condições originárias da produção incluem por si mesmas matérias
consumíveis diretamente, sem trabalho, tais como frutos, animais,
etc.; em consequência, o próprio fundo de consumo aparece como um
componente do fundo
originário de produção.
A
condição fundamental da propriedade baseada na tribo ( à qual
originariamente se reduz a entidade comunitária) – ser membro da
tribo – faz à tribo estrangeira conquistada por outra tribo, à
tribo submetida, uma tribo
sem propriedade e a
reduz a ser uma condição
inorgânica da
produção, com a qual a entidade comunitária se comporta como com
uma condição própria. Por isso, escravidão e servidão são
apenas desenvolvimentos posteriores da propriedade baseada na
organização tribal. Modificam necessariamente todas as formas
desta. A forma a qual menos podem afetar é a forma asiática. Na
unidade auto sustentável4
de manufatura e agricultura, na qual se baseia esta forma, a
conquista não é condição tão necessária como ali onde a
propriedade da terra, a agricultura,
predomina exclusivamente. Por outro lado, dado que nesta forma o
indivíduo nunca se converte em proprietário mas apenas em
possuidor, ele mesmo é no fundo5
a propriedade, o escravo daquilo em que se faz presente a unidade da
comunidade, e aqui a escravidão não elimina as condições do
trabalho nem modifica a relação essencial.
Está
claro até aqui que:
A
propriedade, enquanto é só o comportamento consciente – e posto
para o indivíduo pela entidade comunitária e proclamado e garantido
como lei – com as condições de produção como com condições
suas e enquanto a
existência do produtor aparece como uma existência dentro das
condições objetivas a
ele pertencentes,
só se efetiva por meio da própria produção. A apropriação
efetiva não ocorre primeiramente na relação pensada com estas
condições, mas na relação ativa, real, o efetivar destas como as
condições de sua atividade subjetiva.
Mas,
por conseguinte, fica ao mesmo tempo claro que estas
condições se modificam.
Por meio da caça que as tribos realizam, uma região chega a
converter-se em distrito de caça; por meio da agricultura, a terra,
o solo, é posto pela primeira vez como prolongação do corpo do
indivíduo. Depois que se construiu a cidade
de Roma e seus
cidadãos cultivaram as terras circundantes, as condições da
comunidade passaram a ser outra que as anteriores. O objetivo de
todas estas entidades comunitárias é sua conservação, quer
dizer a reprodução dos indivíduos que a compõem como
proprietários, quer dizer sua reprodução no mesmo modo de
existência, o qual constitui ao mesmo tempo o comportamento dos
membros entre si e por conseguinte constitui a própria comunidade.
Mas, ao mesmo tempo, esta reprodução é necessariamente nova
produção e destruição da forma antiga. Por
exemplo, ali onde cada um dos indivíduos pode possuir certo número
de acres de terra, o mero aumento da população já constitui um
impedimento. Para superá-lo se faz necessária a colonização e
esta faz necessária a guerra de conquista. Como resultado, escravos,
etc. Também ampliação do terreno
público6
por exemplo e patrícios que representam à comunidade, etc. De tal
modo a conservação da comunidade antiga implica a destruição das
condições nas quais se baseia, se converte em seu oposto. Se se
pensara que a produtividade pudesse aumentar-se dentro do mesmo
território, etc., por meio do desenvolvimento das forças produtivas
(este desenvolvimento mostra na agricultura tradicional uma lentidão
máxima), isto requereria novos modos, combinações do trabalho,
grande parte da jornada dedicada à agricultura, etc, e de tal modo
se eliminariam também ( ao mesmo tempo) as velhas condições
econômicas da entidade comunitária. No próprio ato da reprodução
não só se modificam as condições objetivas, por exemplo a aldeia
vira cidade, a terra inculta, campo limpo, etc., mas que também se
modificam os produtores, enquanto desdobram novas qualidades, se
desenvolvem a si mesmos por meio da produção, se transformam,
constroem novas forças e novas representações, novos modos de
inter-relação, novas necessidades e nova linguagem. Quanto mais
tradicional o próprio modo de produção – e este perdura
largamente na agricultura, e na manufatura - , quer dizer, quanto
mais permanece igual a si mesmo o
processo efetivo
da produção, tanto mais constantes são as antigas formas de
propriedade e com isso a entidade comunitária em geral. Onde já se
dá a separação dos membros da comunidade como proprietários
privados em relação a si mesmos como comunidade urbana e como
proprietários de território urbano, se fazem presentes também
condições por meio das quais o indivíduo pode perder
sua propriedade, quer dizer, se dá a dupla relação que o faz
cidadão de igual nível que os demais, membro da entidade
comunitária, e o faz proprietário.
Na forma oriental esta perda
da propriedade quase não é possível, exceto por meio de influxos
completamente exteriores, pois o membro individual da comunidade
nunca entra em uma relação livre com ela, tal que pudesse perder
seu nexo objetivo, econômico, com a comunidade. Está
definitivamente arraigado. Isto se baseia também na união de
manufatura e agricultura, de cidade (a aldeia, vila) e campo. Entre
os antigos, a manufatura e a agricultura aparecem como uma decadência
(ocupação dos “libertos”7
, clientes, estrangeiros), etc. Este desenvolvimento do trabalho
produtivo (separado da subordinação pura à agricultura como
trabalho doméstico de gente livre, manufatura destinada só à
agricultura e a guerra ou para o serviço divino e manufatura
utilizada pela entidade comunitária, como construção de casas, de
ruas, de templos, que se desenvolveu necessariamente por meio do
trato com os estrangeiros, escravos, da ânsia de intercambiar o
produto excedente, etc., dissolve o modo de produção sobre o qual
está baseada a entidade comunitária e também portanto o
indivíduo objetivo,
isto é, o indivíduo determinado como romano, grego, etc. De igual
modo atua o intercâmbio, o endividamento, et cétera.
A
unidade originária entre a forma determinada de organização
comunal (tribal) e a correspondente propriedade sobre a natureza ou
comportamento para com as condições objetivas da produção como
com uma existência natural, como com a existência objetiva do
indivíduo, mediada pela comunidade – esta unidade, que, por um
lado, aparece como a particular forma de propriedade -, tem sua
realidade vivente em um modo determinado da própria produção,
um modo que aparece tanto como comportamento dos indivíduos entre si
quanto como comportamento ativo determinado deles com a natureza
inorgânica, modo de trabalho determinado (o qual é sempre trabalho
familiar, a miúdo trabalho comunitário). Como primeira grande força
produtiva se apresenta a própria comunidade; de acordo com o tipo
particular de condições de produção (por exemplo, pecuária,
agricultura) se desenvolvem modos de produção particulares e forças
produtivas particulares, tanto subjetivas, que aparecem enquanto
propriedades dos indivíduos, como objetivas.
Um estágio determinado do
desenvolvimento das forças produtivas dos sujeitos que trabalham, ao
qual correspondem relações determinadas dos mesmos entre si e com a
natureza: a isso se reduz em última instância sua entidade
comunitária, assim como a propriedade baseada sobre ela. Até certo
ponto, reprodução. Logo se transforma (trastrueca) em dissolução.
Propriedade
significa então originariamente – e o mesmo em sua forma asiática,
eslava, antiga, germânica – comportamento do sujeito que trabalha
(produtor) (o que se reproduz) com as condições de sua produção
ou reprodução como com algo
seu. Terá, em
consequência, distintas formas segundo as condições desta
produção. A produção mesma tem como objetivo a reprodução do
produtor nas e com estas suas condições objetivas de existência.
Este comportamento como proprietários – não enquanto resultado
mas enquanto pressuposto do trabalho, isto é da produção –
pressupõe uma existência determinada do indivíduo como membro de
uma entidade comunitária ou tribal (da qual ele mesmo é até certo
ponto propriedade). A escravidão, a servidão, etc., onde o
trabalhador mesmo aparece entre as condições naturais da produção
para um terceiro indivíduo ou entidade comunitária (este não é
por exemplo o caso na escravidão geral do Oriente; só o é desde o
ponto de vista8
europeu) e, em consequência, a propriedade não é o comportamento
dom as condições objetivas do trabalho por parte do indivíduo
nunca originário, embora necessário e consequente, da propriedade
fundada sobre a entidade comunitária e sobre o trabalho no seio da
entidade comunitária. É por certo mais muito fácil imaginar-se um
indivíduo poderoso, fisicamente superior, que primeiro captura
animais e logo captura homens, para capturar por meio deles mais
animais, que, em suma se serve do homem como de uma condição
natural preexistente de sua reprodução ao igual que se serve de
qualquer outro ser natural ( com o qual seu próprio trabalho se
reduz ao mando, etc.) Mas tal imagem é estúpida – por mas correta
que seja desde o ponto de vista de entidades comunitárias ou tribais
dadas – porque parte do desenvolvimento de homem
isolados. O homem só
se isola por meio do processo histórico. A parece originariamente
com um ser genérico,
um ser tribal,
um animal político9
no sentido
político. O intercâmbio mesmo é um meio fundamental para este
isolamento. Torna supérfluo o caráter gregário e dissolve-o. Nem
bem a coisa chegou a tal ponto que ele como indivíduo isolado já se
relaciona só consigo mesmo, resulta contudo que os meios para por-se
a si mesmo como indivíduo isolado chegaram a consistir em seu
tornar-se ser geral e comunal. Nesta entidade comunitária, a
existência objetiva do indivíduo como proprietário, digamos por
exemplo como proprietário da terra, está pressuposta e por certo
sob certas condições que o encadeiam à entidade comunitária ou
que, mais ainda, o convertem em um elo dessa cadeia. Na sociedade
burguesa, o operário por exemplo está presente de uma maneira
puramente subjetiva, desprovida de caráter objetivo, mas a coisa,
que se contrapõe
a
ele, tornou-se a verdadeira
entidade comunitária,
a qual ele trata de devorar e pela qual é devorado.
Todas as formas (em maior ou menor
grau naturais, mas todas ao mesmo tempo resultado também do processo
histórico), nas quais a entidade comunitária pressupõe aos
sujeitos em uma unidade objetiva determinada com suas condições de
produção, nas quais se dá uma existência subjetiva determinada
que pressupõe à entidade comunitária mesma como condições de
produção, necessariamente correspondem só à um desenvolvimento
limitado, limitado por princípio, das forças produtivas. O
desenvolvimento das forças produtivas dissolve a essas comunidades e
tal dissolução é ela mesma um desenvolvimento das forças
produtivas humanas. Se trabalha primeiro a partir de um certo
fundamento: primeiro natural , depois pressuposto histórico. Mas
logo este fundamento ou pressuposto mesmo é eliminado ou posto como
um pressuposto que há de desaparecer e que se tornou demasiado
estreito para o desdobramento da massa humana em progresso.
Enquanto a antiga propriedade
territorial reaparece na propriedade parcelária, se lhe deve incluir
na economia política e nos ocupamos dela no fragmento sobre a
propriedade da terra.
(Voltar a tudo isto em mais detalhe
e com maior profundidade)
1Os
citas eram um antigo povo iraniano de pastores nômades equestres.
NT,
3roaming
4self-sustaining
5au fond
6ager publicus, terra pública.
7Libertini
8Point of view
9
Aquilo
que nos ocupa aqui em primeiro lugar: o comportamento do trabalho com
o capital, ou com as condições objetivas do trabalho presentes como
capital, pressupõe um processo histórico, que dissolve as diversas
formas nas quais o trabalho é proprietário ou o proprietário
trabalha. Assim, essencialmente (sobretudo): 1) dissolução do
comportamento para com a terra – solo – como com uma condição
natural da produção, com a qual o trabalhador se comporta como com
sua própria existência inorgânica, como com o laboratorium de suas
forças e o domínio de sua vontade. Todas as formas nas quais está
presente esta propriedade supõem uma entidade
comunitária,
cujos membros, quaisquer que sejam as diferenças formais, que possam
existir entre eles, como membros da mesma são proprietários.
A forma originária desta propriedade é, em consequência, ela
mesma propriedade
comum imediata (forma
oriental,
modificada na eslava, desenvolvida até sua antítese, mas, contudo,
ainda fundamento oculto, embora antiético, na propriedade antiga e
germana). 2) Dissolução das relações nas quais ele aparece como
proprietário do instrumento. Assim como a forma acima citada da
propriedade da terra supõe uma entidade comunitária real, de igual
modo, esta propriedade do instrumento por parte do trabalhador supõe
uma forma particular do desenvolvimento do trabalho manufatureiro
como trabalho
artesanal;
com isto se conecta o sistemadas corporações de ofício, etc. (O
sistema manufatureiro oriental antigo pode ser já considerado sob
1.) Aqui o trabalho mesmo é ainda metade artesania, metade fim em si
mesmo, etc. Maestria. O capitalista mesmo, ainda mestre. A habilidade
particular para um trabalho também assegura a possessão do
instrumento, etc. Logo, caráter hereditário, em certa medida, do
modo de trabalho, junto com a organização do trabalho e o
instrumento de trabalho. Organização urbana medieval. O trabalho
todavia como algo próprio; desenvolvimento determinado
autossuficiente de capacidades unilaterais, etc. 3) Implícito em
ambos os casos, que o trabalho antes da produção – em
consequência durante a produção, antes da finalização da mesma –
tem em sua possessão o meios de consumo necessários para viver como
produtor. Como proprietário da terra, ele aparece fornecido
diretamente do fundo de consumo necessário. Como mestre artesão, o
herdou, ganhou, salvou, e, como jovem artesão, é primeiro
aprendiz, caso no qual ainda não aparece como trabalhador
propriamente dito, autônomo, mas que comparte patriarcalmente o
custo com o mestre. Como oficial (efetivo) há uma certa comunidade
do fundo de consumo que possui o mestre. Embora esse fundo não seja
propriedade dos oficiais, contudo, de acordo com as leis da
corporação, com suas tradições, etc., é pelo menos sua possessão
comum, etc.(Prosseguir com este tema.) 4) Por outro lado dissolução,
igualmente, das relações nas quais os trabalhadores
mesmos,
as capacidades
vivas do trabalho
estão ainda imediatamente
incluídas
entre as condições
objetivas de trabalho e
como tais são apropriadas e são portanto escravos ou servos. Para o
capital, o trabalhador não é condição alguma da produção, mas
que só é o trabalho. Se ele pode cumpri-los por meio de máquinas,
ou simplesmente por meio da água ou do ar, tanto melhor1.
E o capital não se apropria do trabalhador mas de seu trabalho, não
imediatamente, mas mediado pelo intercâmbio.
Estes
são, então, por um lado, os pressupostos históricos para que
encontremos o trabalhador como trabalhador livre, como capacidade de
trabalho puramente subjetiva, desprovida de objetividade, enfrentando
às condições objetivas da produção como a sua não
propriedade,
como a propriedade
alheia,
como valor
que
para si mesmo. Mas, por outro lado, perguntamos: que condições são
necessárias para que o trabalhador encontre diante de sí um
capital?
Na
fórmula do capital, na qual o trabalho vivo se comporta como o
material bruto, tanto como instrumento, como também com os meios de
subsistência requeridos durante o trabalho tratando-os como não
propriedade, de maneira negativa, primeiro2
está
implícita a não propriedade da terra,
se nega aquele estado no qual o indivíduo que trabalha se comporta
com a terra como com algo próprio, isto é, que trabalha, que
produz, como proprietário do solo. A propriedade do solo implica
potencialmente tanto a propriedade do material em bruto como a do
instrumento originário, a terra mesma, como também a dos frutos
espontâneos desta. Posto isto em sua forma mais originária,
significa comportar-se com a terra como proprietário, encontrar nela
material em bruto como algo disponível, também instrumento e meios
de subsistência não criados pelo trabalho mas pela terra mesma. Uma
vez produzida esta relação, os instrumentos secundários e os
frutos da terra criados pelo trabalho mesmo, aparecem como incluídos
na propriedade da terra em suas formas mais primitivas. Em
consequência, na relação do trabalhador com as condições de
trabalho enquanto capital, este estado histórico é negado
primeiramente como comportamento que implica uma relação mais plena
de propriedade. Este é o estado histórico nº I, o qual nesta
relação é negado ou é pressuposto como historicamente dissolvido.
Mas, em segundo lugar, ali onde se dá a
propriedade do instrumento,
ou o comportamento do trabalhador com o instrumento como como algo
próprio, ali onde o trabalhador trabalha como proprietário do
instrumento (o qual por sua vez pressupõe a subsunção do
instrumento sob seu trabalho individual, quer dizer que pressupõe
estágios particulares limitados do desenvolvimento da produtividade
do trabalho), ali onde está posta esta forma do trabalhador
como proprietário
ou do proprietário
trabalhador
como forma autônoma junto à propriedade
da terra,
e fora desta (isto é, onde se dá o desenvolvimento artesanal e
urbano do trabalho), não como no primeiro caso enquanto acidente
da propriedade da terra e subsumida sob esta e em consequência
também o material em bruto e os meios de subsistência são agora
mediados
enquanto propriedade do artesão, mediados por seu trabalho
artesanal, por sua propriedade do instrumento), ali, então, já está
pressuposto um segundo estagio histórico junto e simultaneamente
fora do primeiro, e o primeiro mesmo, a su vez, já deve aparecer
significativamente modificado por meio da autonomização
deste tipo de propriedade ou de proprietário trabalhador.
Dado que o instrumento mesmo é já produto do trabalho e, em
consequência, o elemento que constitui a propriedade já é posto
como resultado do trabalho, a entidade comunitária já não pode
aparecer aqui na forma natural, como no primeiro caso – a entidade
comunitária, sobre a qual está fundado este tipo de propriedade -,
mas como entidade comunitária que já é ela mesma produzida,
gerada, secundária, já produzida pelo trabalho mesmo. Resulta claro
que ali onde a propriedade do instrumento é o comportamento com as
condições de produção do trabalho efetivo como
meio
para o trabalho individual; a arte de apropriar-se efetivamente do
instrumento, de manejá-lo como meio de trabalho, aparece como uma
habilidade particular do trabalhador, a qual o põe como proprietário
do instrumento. Em suma, o caráter essencial da organização
corporativa gremial, do trabalho artesanal como sujeito deste
enquanto constituinte de proprietários, há de reduzir-se ao
comportamento com o instrumento de trabalho como propriedade – a
diferença do comportamento com a terra, com o solo (com a matéria
prima enquanto tal) como com algo próprio, O que o comportamento com
este modo singular das condições de produção constitua ao sujeito
trabalhador como proprietário, que o faça um proprietário que
trabalha, ou seja, este estado histórico nº II – que, de acordo
com sua natureza, só pode existir como ampliação do primeiro
modificado – é algo que também é negado na primeira fórmula do
capital. A terceira forma
possível,
ou seja comportar-se como proprietário só com os meios de
subsistência, encontrá-los a estes, dados como condição natural
do sujeito que trabalha, sem comportar-se como o solo nem com o
instrumento nem tampouco com o trabalho mesmo como algo próprio, é
no fundo a fórmula da escravidão e servidão, que também é
negada, que está posta como estado historicamente dissolvido na
relação do trabalhador com as condições de produção como
capital. As formas originárias da propriedade se reduzem
necessariamente à relação com os distintos momentos objetivos
como próprios; constituem o fundamento econômico de formas
distintas de entidades comunitárias e, de igual modo, têm como
presuposto, por sua parte, formas determinadas de entidade
comunitária. Essas formas são essencialmente modificadas ao ser
colocado o trabalho entre as condições
objetivas da produção
(servidão e escravidão) com o qual se modifica i se perde o caráter
afirmativo simples de todas as formas de propriedade incluíveis no
nº I. Todas elas contêm em si a escravidão como possibilidade e,
por isso, como sua própria abolição. No que se refere à nº II,
onde o tipo particular do trabalho - a maestria em tal trabalho e
correspondentemente a propriedade do instrumento de trabalho igual
propriedade das condições de produção -, exclui por certo
escravidão e servidão, mas sob a forma da organização de castas
pode conter um desenvolvimento análogo negativo. A terceira forma, a
da propriedade dos meios de subsistência – quando não se reduz à
escravidão e à servidão -, não pode conter uma relação do
indivíduo que
trabalha com
as condições de existência; só pode, em consequência, sem a
relação do membro da entidade comunitária originária, fundada na
propriedade da terra, mas que perdeu a propriedade da terra e todavia
não passou ao tipo II, tal como no caso da plebe romana na época do
panes et circenses3
A relação do agregado4
com seu senhor territorial, ou a prestação pessoal, é
essencialmente diferente. Pois no fundo5,
ela representa só um modo de existência do proprietário mesmo da
terra, o qual já não trabalha, mas cuja propriedade inclui entre as
condições da produção aos próprios trabalhadores como servos,
etc. Aqui, a relação
senhorial como
relação essencial da apropriação. Com o animal, com o solo, etc.
, não pode ter lugar no fundo6
relação senhorial alguma por meio da apropriação ainda quando o
animal possa servir. A apropriação de uma vontade
alheia
é pressuposto da relação senhorial. Por certo, o desprovido de
vontade, como o animal por exemplo, pode então servir, mas não faz
a seu proprietário senhor.
Do visto resulta que a relação
senhorial
e a relação
de servidão
correspondem igualmente a esta fórmula da apropriação dos
instrumentos de produção e constituem um fermento necessário do
desenvolvimento e da decadência de todas as relações de
propriedade e de produção originárias, tanto que expressam também
o caráter limitado destas. Sem dúvida se reproduzem – em forma
mediada – no capital e, de tal modo, constituem também um fermento
para sua dissolução e são emblema do caráter limitado daquele.
1Tant
mieux
3Pão e circo
4retainer: servidor ligado à casa do senhor, agregados
5Au fond
6Au fond
“O
poder de vender-se a si mesmo e aos seus por necessidade foi um
direito penoso e geral: teve vigência no norte assim como entre os
gregos e na Ásia; quase igualmente difundido estava o direito do
credor a tomar como seu servo a aquele que se atrasara no pagamento e
a fazer-lhe pagar até onde pudesse com seu trabalho ou com a venda
de sua pessoa” (Niebuhr,
1, p. 600).
Niebuhr
disse em algum lugar que, para os escritores gregos que escreviam na
época de Augusto, a dificuldade e a falsa compreensão da ralação
entre os patrícios e os plebeus e sua confusão desta relação com
a relação entre patrões e clientes provinha de que eles “escreviam
em uma época na qual ricos
e pobres eram as únicas classes verdadeiras de cidadãos,
na qual o indigente , por mais nobre que fosse sua origem,
necessitava um protetor e ao milionário, ainda quando fora um
liberto, se lhe buscava como protetor. Dificilmente poderia já
reconhecer sequer rastros de relações hereditárias de lealdade”
(I, 620). “Os artesãos se encontravam em ambas as classes” -
metecos e
libertos e seus descendentes -
“e o plebeu que abandonava a agricultura passava
ao tipo de cidadania que aqueles estavam imitados. Nem sequer estavam
privados de pertencer aos grêmios
legais
e suas corporações eram tão altamente respeitadas que se atribuiu
sua fundação a Numa;
eram 9: tocadores de pífano, ourives, carpinteiros, tintureiros,
seleiros, curtidores, caldeireiros, oleiros e a nona corporação,
que reunia aos demais ofícios... Alguns deles eram cidadãos
autônomos, isopolitas1
que não dependiam, de nenhum patrão (quando tal direito existia), e
descendentes de servos, cujo laço se havia dissolvido por meio da
extinção da linhagem de seus patrões: todos eles eram tão alheios
às disputas dos velhos cidadãos e dá comunidade como as
corporações florentinas às querelas entre linhagens, tais como as
dos guelfos e gibelinos; provavelmente os servos estiveram em sua
totalidade a disposição dos patrícios,” (I, 623).
Por
um lado se pressupõem processos históricos que colocaram a uma
massa de indivíduos de uma nação, etc., em uma situação que,
durante um primeiro momento não é a de verdadeiros trabalhadores
livres, é, contudo, a de quem o são potencialmente2,
cuja única propriedade é sua capacidade de trabalho e a
possibilidade de trocá-lo por valores preexistentes, indivíduos aos
quais todas as condições objetivas da produção se lhes contrapõem
como propriedade
alheia,
como sua
não-propriedade,
mas ao mesmo tempo com trocáveis enquanto valores
e
portanto até um certo grau apropriáveis por meio de trabalho vivo.
Tais processos históricos de dissolução implicam simultaneamente a
dissolução das relações de servidão que fixam o trabalhador ao
solo e ao senhor da terra, mas pressupõem faticamente propriedade de
meios de subsistência por parte do servo: este é , em verdade, seu
processo de separação da terra, dissolução das relações de
propriedade territorial que não o constituíam como yeoman3,
pequeno proprietário da terra, livre e que trabalha, ou como
arrendatário (colonus),
como camponês livre4;
dissolução das relações de corporação, que pressupõe sua
propriedade do instrumento de trabalho e o trabalho mesmo como
habilidade artesanal determinada, como propriedade (não como fonte
desta); igualmente, dissolução das relações de clientela as
diversas formas em que não-proprietários
aparecem no séquito de seu senhor como consumidores conjuntos do
produto
excedente5,
e que como equivalente levam o uniforme de seu senhor, tomam parte de
suas querelas, realizam prestações de serviços pessoais,
imaginários ou reais, etc. Um exame mais detalhado mostrará que em
todos esses processos de dissolução se dissolvem as relações de
produção em que predomina o valor de uso, a produção para o uso
imediato; o valor de troca e a produção do mesmo tem como
pressuposto o predomínio por parte da outra forma: por conseguinte,
em todas estas relações predominam as contribuições em espécie e
os serviços em espécie sobre os pagamentos em dinheiro e as
prestações em dinheiro. Mas isto só o mencionamos ao passar. Com
uma consideração mais circunstanciada se encontrará igualmente que
todas as relações dissolvidas só eram possíveis dado um grau
determinado de desenvolvimento das forças produtivas materiais (e,
em consequência, também das espirituais).
O
que nos interessa qui em primeiro lugar é isto: o processo de
dissolução que transforma a uma massa de indivíduos de uma nação,
etc., em trabalhadores assalariados potencialmente6
(em indivíduos obrigados ao trabalho e à venda de trabalho só por
meio de sua carência de propriedade), supõe, por outro lado, não
que as fontes de renda e, em parte, as condições de propriedade
destes indivíduos existentes até esse momento desapareceram,
senão, ao inverso, que só
sua
utilização mudou, que a índole da existência se transformou, que
passaram a outras mãos como fundo
livre
ou também que ficaram em parte nas
mesmas mãos.
Mas isto é claro: o mesmo processo que separou a uma multidão de
indivíduos de suas relações preexistentes afirmativas - de
uma maneira ou de outra7
- com as condições
objetivas do trabalho,
processo que negou estas relações e desse modo transformou a estes
indivíduos em
trabalhadores livres,
este mesmo processo liberou potencialmente8
a estas condições
objetivas de trabalho
- solo, material em bruto, meios de subsistência, instrumento de
trabalho, dinheiro ou tudo isto em conjunto - de sua ligação
vigente
até então com
os indivíduos agora separados delas. Estas ainda existem
sob outra forma: como fundo
livre,
no qual se extinguiram todas as velhas relações políticas, etc. e
que ainda estão contrapostas a esse indivíduo desprovido de
propriedade só sob a forma de valores, de valores
com
base firme em si mesmos. O mesmo processo que contrapõe a massa,
como trabalhadores livres, às condições
objetivas de produção,
contrapôs estas condições, como capital,
aos trabalhadores livres. O processo histórico consistiu na
separação de elementos até então ligados: por conseguinte, seu
resultado não consiste em que um dos elementos desapareça, senão
em que cada um deles apareça em uma relação negativa com o outro,
o trabalhador livre (enquanto possibilidade), por um lado, o capital
(enquanto possibilidade), pelo outro. A separação com relação às
condições objetivas das classes que se vêm transformadas em
trabalhadores livres, deve igualmente aparecer no polo contraposto
como uma autonomização destas condições.
Se
a relação de capital e trabalho assalariado não é considerada
como a relação já de por si determinante e que predomina sobre o
todo da produção9,
senão como uma relação que se gera historicamente, quer dizer, se
se considera a transformação originária de dinheiro em capital, o
processo de intercâmbio entre o capital existente só
potencialmente10,
por um lado, com o trabalhador livre só potencialmente11
pelo outro, se impõe naturalmente a simples observação, à qual os
economistas outorgam tanto peso, de que o lado que se apresenta como
capital deve estar em possessão de matérias primas, instrumentos de
trabalho e meios de subsistência para que o trabalhador possa viver
durante a produção, antes de que a produção chegue ao seu
término. Também, isto suscita a impressão de que deve ter ocorrido
previamente uma acumulação - uma acumulação prévia ao trabalho e
não surgida deste - por parte do capitalista, a qual o capacita para
por a trabalhar aos operários e para mantê-los efetivamente, para
mantê-los como capacidade vivente do trabalho12.
Este ato do capital não posto pelo trabalho e independente dele é
movido depois desde essa história de sua gênese até o presente, se
os transforma em um momento de sua realidade e sua efetividade, em um
momento de sua autoformatação. Em seguida, se deriva finalmente
dali o direito do capital aos frutos do trabalho alheio ou, melhor,
se deriva seu modo de aquisição a partir das leis simples e
"justas" do intercâmbio de equivalentes.
3yeoman: camponês inglês, pequeno proprietário
4A dissolução das formas ainda mais antigas de propriedade coletiva e de comunidade real é algo óbvio (nota de Marx)
5surplusproduce
6δυνάμει
7d'une manière ou d'une autre
8δυνάμει
9Pois neste caso o capital pressuposto como condição do trabalho assalariado é produto do trabalho mesmo e, como condição deste, se pressupões a si mesmo, é criado pelo trabalho como pressuposto para o próprio trabalho. (Nota de Marx)
10δυνάμει
11δυνάμει
12Nem bem o capital e o trabalho assalariado são postos como pressuposto de si mesmos, como base pressuposta da produção mesma, a coisa se apresenta em princípio assim: que o capitalista cria os meios de subsistência além do fundo de material em bruto e meios de trabalho necessários para que o trabalhador se reproduza, ou seja, realiza o trabalho necessário, possui um fundo de material em bruto e instrumentos de trabalho nos quais o trabalhador torna efetivo seu trabalho excedente , isto é, o lucro do capitalista. Uma analise mais profunda põe em relevo que o trabalhador cria constantemente um duplo fundo para o capitalista ou que sob a forma do capital cria um duplo fundo, do qual uma parte satisfaz continuamente as condições de sua própria existência e a outra as condições de existência do capital. como vimos, no capital excedente - e capital excedente em relação com sua relação antediluviana com o trabalho - está todo o capital real, atual, e todo elemento do mesmo é uniformemente trabalho alheio objetivado e apropriado pelo capital, apropriado sem intercâmbio, sem entrega de equivalente para ele.
A riqueza existente sob a forma de
dinheiro só pode mudar-se pelas condições objetivas do trabalho
porque e quando estas estão separadas do trabalho mesmo. Vimos que
em parte se pode acumular dinheiro por meio do puro e simples
caminho do intercâmbio de equivalentes: contudo, isto constitui uma
fonte tão pouco significativa que, desde um ponto de vista
histórico, se se pressupõe que se ganhou o dinheiro por meio do
intercâmbio de trabalho próprio, nem sequer merece ser mencionada.
Isto ocorre, mais por meio da usura - em particular exercida também
com relação à propriedade da terra - e por meio de um patrimônio
móvel acumulado mediante os ganhos comerciais, patrimônio-dinheiro
que se transforma em capital no sentido estrito, em capital
industrial. Mais adiante teremos oportunidade de falar mais
longamente de ambas as formas propriamente ditas do capital, senão
como formas mais precoces de patrimônio, como pressuposto para o
capital.
Tal
como vimos, está presente no conceito do capital, sua gênese, o que
surge (decorre) do
dinheiro e,
portanto, do patrimônio que existe sob a forma dinheiro. Está alí
igualmente presente o que surge da circulação, que aparece como
produto
da circulação. A formação de capital não provem da propriedade
da terra (aqui pode surgir no máximo o arrendatário
enquanto este é comerciante em produtos agrícolas); tampouco da
corporação (ainda que neste último ponto haja uma possibilidade),
mas do patrimônio mercantil e usurário. Mas só encontra as
condições para comprar trabalho livre uma vez que este é separado
de suas condições objetivas de existência pelo processo histórico.
Só então encontra também possibilidade de comprar estas condições
mesmas. Sob as condições de organização corporativa, por exemplo,
o mero dinheiro, que não é ele mesmo corporativo, que é dos
mestres, não pode comprar teares para fazê-los trabalhar, está
prescrito quantos podem trabalhar para um mestre, etc. Em suma, o
instrumento mesmo esta ainda tão aderido ao trabalho vivo mesmo,
aparece como seu domínio até tal ponto, que verdadeiramente não
circula. O que capacita ao patrimônio dinheiro para tornar-se
capital é a presença, por um lado dos trabalhadores livres;
segundo, a presença como igualmente livres
e vendíveis dos meios de subsistência e materiais, etc., que antes
eram de
uma maneira ou de outra
propriedade
das massas, que agora ficaram desprovidas do capital, a outra
condição do trabalho, etc. - está já
presente
para esse patrimônio, em parte como resultado da organização
corporativa urbana, em parte como resultado da industria doméstica
ou ligada à agricultura como atividade acessória. O processo
histórico não é o resultado do capital, mas o pressuposto do
mesmo. Por meio deste processo, o capitalista se inserta como
intermediário (histórico) entre a propriedade da terra, ou entre a
propriedade em geral, e o trabalho. A história desconhece as ilusões
sentimentais segundo as quais o capitalista e o trabalhador
estabelecem uma associação, etc.: disso não se encontra rastro
algum no desenvolvimento do capital como categoria. Esporadicamente
pode desenvolver-se localmente a manufatura
em um marco que corresponda ainda á um período completamente
distinto, como por exemplo nas cidades italianas, junto
às
corporações. Mas como forma generalizada, predominante, de uma
época, as condições para o capital devem estar desenvolvidas não
só localmente, mas em grande escala (Não se opõe a isto o fato de
que ao ocorrer a dissolução das corporações, alguns mestres se
transformam em capitalistas industriais; contudo, o caso é raro e o
é de acordo com a natureza da coisa. Em conjunto, a organização
corporativa se arruína, o mestre e o oficial se arruínam, ali onde
surge o capitalista e o operário.)
É
obvio - e isto se ve examinando mais circunstanciadamente as épocas
históricas das quais aqui se fala - que, de fato,
a época da dissolução dos
modos prévios de comportamento do trabalhador com as condições
objetivas do trabalho é ao
mesmo tempo uma época
na qual, por um lado, o patrimônio-dinheiro
se desenvolveu até alcançar certa amplitude, e que por outro lado,
este cresce e se estende em virtude das mesmas circunstâncias que
aceleram essa dissolução. O mesmo é também um dos agentes dessa
dissolução, assim como essa dissolução é uma condição da
transformação desse patrimônio em capital. Mas a mera existência
do patrimônio-dinheiro, e inclusive o que este ganhe por sua parte
uma espécie de supremacia1,
não basta de nenhum modo para que essa dissolução
resulte em capital.
A não ser que, a antiga Roma, Bizâncio, etc., tivessem concluído
sua história com trabalho livre e capital ou, mais, tivessem
começado uma nova história. Também ali a dissolução das velhas
relações de propriedade estava ligada com o desenvolvimento do
patrimônio-dinheiro; do comércio, etc. Mas em vez de conduzir à
indústria, esta dissolução conduziu de
fato2
ao predomínio do campo sobre a cidade. A forma
originária do capital
não ocorre, como se pensa, porque o capital acumule
meios
de subsistência e instrumentos de trabalho e matérias primas ou, em
suma, porque acumule as condições objetivas
da produção separadas do solo e já fundidas com o trabalho
humano.3
O capital não cria as condições objetivas do trabalho. Mas sua
formação originária
ocorre simplesmente enquanto, por meio do processo histórico de
dissolução do antigo modo de produção, o valor existente como
patrimônio-dinheiro adquire,
por um lado, a capacidade de comprar
as
condições objetivas do trabalho, pelo outro, a de trocar com os
trabalhadores liberados o trabalho vivo
por dinheiro. Todos estes momentos acontecem; sua própria
diferenciação é um processo histórico, um processo de dissolução
e é este
o que faz o dinheiro capaz de transformar-se em
capital.
O dinheiro mesmo, enquanto participa ativamente neste processo
histórico, só é ativo enquanto ele mesmo intervém como um meio de
separação extremamente enérgico e enquanto colabora na produção
dos trabalhadores
livres
desprovidos do objetivo, despojados;
mas, seguramente, não porque crie para eles as condições objetivas
de sua existência, mas porque ajuda a acelerar sua separação
destas: sua carência de propriedade. Quando, por exemplo, os grandes
proprietários de terra ingleses licenciaram a seus agregados4,
que consumiam junto com eles o produto-exedente5
da terra, e, também, seus arrendatários expulsaram aos pequenos
camponeses sem terra,
etc., jogaram assim, em primeiro lugar, uma massa de forças de
trabalho ao
mercado de trabalho,
uma massa que era livre em um duplo sentido, livre das antigas
relações de clientela ou de servidão e das relações de prestação
e, em segundo lugar, livre de toda possessão e de toda forma de
existência como coisa, de toda forma de existência objetiva, livre
de toda propriedade, à que se lhe apresentava como única fonte de
recursos a venda de sua capacidade de trabalho ou a mendicância, a
vagabundagem e o roubo. Está historicamente comprovado que essa
massa tentou ao princípio este último, mas que foi empurrada para
fora, dessa via, por meio da forca, do pelourinho, do chicote, até
ao estreito caminho que leva ao mercado de trabalho; de tal modo que
os governos,
por exemplo Henry VII,VIII, etc., aparecem como condições do
processo histórico de dissolução e como criadores das condições
para a existência do capital. Por outro lado, os meios de
subsistência, etc., que os proprietários da terra antes consumiam
junto com os agregados6,
estiveram agora a disposição do dinheiro que quiser comprá-los
para comprar trabalho por seu intermédio7.
O dinheiro não havia criado
esses meios de subsistência, nem os havia acumulado:
tais meios estavam ali, eram consumidos e reproduzidos antes de que
se os consumisse e reproduzisse por intermédio do dinheiro. O que
havia mudado não era outra coisa que o fato de que agora estes
meios de subsistência eram jogados ao mercado
de troca,
eram separados de sua conexão imediata com as bocas dos agregado8,
etc., e eram transformados de valores de uso em valores de troca,
pelo qual caiam sob a supremacia do patrimônio-dinheiro. O mesmo
ocorreu com os instrumentos de trabalho. O patrimônio-dinheiro não
descobriu nem fabricou o torno de fiar nem o tear. Mas, separados de
sua terra, os fiadores e tecedores com seus teares e tornos caíram
sob o império do patrimônio-dinheiro. etc. O
próprio do capital não é outra coisa que o acoplamento das massas
de braços e instrumentos que ele encontra pre existentes. Os
aglomera sob seu império. Essa
é sua
verdadeira acumulação:
a acumulação de trabalhadores em certos pontos junto com seus
instrumentos. Disto temos de tratar mais detidamente ao ocupar-nos da
chamada acumulação do capital. O patrimônio-dinheiro - como
patrimônio mercantil - ajudou sem dúvida a acelerar e dissolver as
antigas relações de produção e o fez possível ao proprietário
da terra por exemplo, tal como tão bem o mostrou Adam Smith, trocar
seus cereais, gado, etc., por valores de uso trazidos do estrangeiro
em vez de desperdiçar com agregados9
os valores de uso produzidos por ele mesmo e de encontrar em sua
maior parte sua riqueza na massa de agregados
que consumiam junto com ele. Deu uma maior significação ao valor de
troca da renda do proprietário da terra. Isto também aconteceu no
que toca à seus arrendatários, os quais já eram meio-capitalistas,
mas o eram, contudo, de uma maneira ainda muito coberta de
ornamentos. O desenvolvimento do valor de troca - graças ao dinheiro
existente sob a forma de uma camada social de mercadores - dissolve a
produção mais orientada para o valor de uso imediato e as formas de
propriedade a ela correspondentes - relações do trabalho com
relação à suas condições objetivas - e empurra assim para a
criação do mercado
de trabalho
( que não deve confundir-se com o mercado de escravos).
1supremacy
3Resulta claro à primeira vista que círculo absurdo se daria se, por um lado, os trabalhadores que o capital deve pôr em ação para pôr a si mesmo como capital devessem primeiro ser criados, devessem ser chamados à vida, por meio da acumulação do capital, devessem esperar desse seu "Que o Trabalho seja!", enquanto, por outra parte, o capital mesmo não fosse capaz de acumular-se sem trabalho alheio; o máximo que poderia fazer seria acumular seu próprio trabalho, quer dizer, existir então ele mesmo como não-capital e não-dinheiro, pois o trabalho antes da existência do capital só pode valorizar-se a si mesmo em formas tais como a do trabalho artesanal, a agricultura em pequena escala, etc., em suma, só em formas que não permitem acumular ou só o permitem em escassa medida, em formas que só deixam um pequeno produto excedente, ao qual consomem em sua maior parte. Finalmente teremos que investigar mais detidamente esta imagem da acumulação. (Nota de Marx)
4retainers: servidores ligados à casa do senhor, agregados
5surplusproduce
6retainers: servidores ligados à casa do senhor, agregados
7through their instrumentality
8retainer: servidor ligado à casa do senhor, agregados
9retainers: servidores ligado à casa do senhor, agregados
Contudo,
inclusive esta ação do dinheiro só era possível sob o pressuposto
da atividade
artesanal urbana,
a qual não
estava baseada sobre o capital e o trabalho assalariado, mas sobre a
organização do trabalho em corporações, etc. O trabalho urbano
mesmo havia criado meios de produção, para os quais as corporações
eram tão
irritantes1
como as antigas relações de propriedade da terra para uma
agricultura melhorada, que em parte era ela mesma, também,
consequência da grande venda dos produtos agrícolas nas cidades,
etc. as outras circunstâncias que, por exemplo no século XVI
aumentaram a massa de mercadorias circulantes assim como a do
dinheiro, criaram novas necessidades e elevaram assim o valor de
troca dos produtos locais, subiram os preços, etc., tudo o qual
estimulou, por um lado, a dissolução das antigas relações de
produção, acelerou a separação do trabalhador, ou do não
trabalhador mas capaz de trabalhar, com relação às condições
objetivas de sua reprodução e estimulou assim a transformação do
dinheiro em capital. Nada mais estúpido então que conceber esta
formação
originária do
capital como se este tivesse acumulado e criado as condições
objetivas da produção
- meios de subsistência, material em bruto, instrumentos - e as
teria brindado aos trabalhadores despojados
delas. Mais bem, o patrimônio-dineiro ajudou em parte à despojar
destas condições às forças de trabalho dos indivíduos capazes de
trabalhar e em parte esse processo avançou sem ele. Uma vez que
esta formação originária alcançou certo nível, o
patrimônio-dinheiro pôde colocar-se como intermediário entre as
condições objetivas da vida assim liberadas e as forças de
trabalho vivas, liberadas, mas também isoladas
e vazias,
e pôde assim comprar a uma com as outras. Mas indo agora ao que faz
para a formação
do patrimônio-dinheiro
mesmo, antes de sua transformação em capital ela pertence à
pré-história da economia burguesa. A usura, o comércio, o regime
urbano e o fisco que surge com ele desempenham papéis centrais neste
processo. Também o atesouramento
por parte dos arrendatários, camponeses, etc., embora em menor grau.
Se vê aqui ao mesmo tempo como o desenvolvimento do intercâmbio e
do valor de troca, que em todas partes é mediado pelo comércio, ou
cuja intermediação pode ser chamada comércio (o dinheiro mantém
uma existência autônoma na fase mercantil, assim como a circulação
a tem no comércio), traz consigo tanto a dissolução das relações
de propriedade
do trabalho sobre suas condições
de existência, como a dissolução do trabalho
mesmo tratado como uma das condições objetivas da produção;
só relações que expressam um predomínio tanto do valor de uso e
da produção orientada ao uso imediato como de uma entidade
comunitária real, existente ainda de maneira imediata como
pressuposto da produção. A produção baseada sobre o valor de
troca e a entidade comunitária baseada sobre o intercâmbio destes
valores de troca supõe e produz a separação do trabalho com
relação a suas condições objetivas (por mais que os valores de
troca tal como vimos no capítulo acerca do dinheiro, pareçam pôr a
propriedade puramente como resultado do trabalho, pareçam pôr como
condição a propriedade privada do produto do trabalho próprio, e o
trabalho como condição geral da riqueza). este intercâmbio de
equivalentes acontece, enquanto é só a camada superficial de uma
produção que descansa sobre a apropriação do trabalho alheio sem
intercâmbio,
mas sob a aparência
do intercâmbio.
Este sistema do intercâmbio descansa sobre o capital
como seu fundamento e se se o considera separado dele, se se o
considera como tal como se mostra na superfície, como sistema
autônomo,
o que se dá é uma mera aparência,
mas uma aparência
necessária.
Por isso não devemos já assombramos de que o sistema dos valores de
troca - intercâmbio de equivalentes medidos pelo trabalho - se
transmute ou melhor mostre como seu fundo oculto a
apropriação de trabalho alheio sem intercâmbio,
separação plena de trabalho e propriedade. Precisamente o domínio
do valor de troca mesmo e da produção que produz valor de troca,
supõe
capacidade alheia de trabalho como valor de troca - quer dizer,
separação da capacidade viva de trabalho com relação a suas
condições objetivas; comportamento com estas, ou com sua própria
objetividade, como com propriedade alheia; comportamento com essas
condições, em uma palavra, tratando-as como, capital.
Só nos tempos do ocaso da organização feudal, onde todavia ainda
se luta dentro desta - tal como na Inglaterra no século XIV e na
primeira metade do XV -, se dá a época de ouro do trabalho em
processo de emancipação. Para que o trabalho outra vez volte a
comportar-se com suas condições objetivas como som sua propriedade
deve aparecer outro sistema em lugar do sistema do intercâmbio
privado, o qual como temos visto, põe o intercâmbio de trabalho
objetivado por capacidade de trabalho e, em consequência, a
apropriação do trabalho vivo sem intercâmbio. A maneira em que o
dinheiro se transforma em capital, se faz visível a miúdo
historicamente em forma completamente simples e manifesta como quando
o mercador, por exemplo, faz trabalhar para si mais tecedores e
fiandeiros, que até esse momento trabalhavam no tecer e no fiar
como atividade acessória da agricultura, de tal modo que converte
sua atividade acessória em ocupação central; mas daí em diante
está mais seguro deles e os converteu em trabalhadores assalariados
sob seu império. Mudá-los então de seus lugares de origem e
reuni-los em uma casa de trabalho é um passo posterior. Neste
simples processo se vê claramente que o capitalista não preparou
material em bruto, nem instrumento, nem meios de subsistência para
os tecedores e fiandeiros. Tudo o que ele fez foi limitá-los cada
vez mais a um tipo de trabalho, no qual se tornam dependentes da
venda, do comprador,
do comerciante
e finalmente só produzem para e por
intermédio dele.
Originariamente este só comprava trabalho por meio da compra do
produto: nem bem os trabalhadores se limitaram à produção deste
valor de troca imediato, intercambiar todo seu trabalho por dinheiro
para poder seguir existindo, caem sob o império do comerciante e
finalmente desaparece também a aparência de que eles
vendam
à ele seus produtos. Ele compra seu trabalho e lhes paga primeiro a
propriedade do produto, em seguida também a do instrumento ou se as
deixa como propriedade
aparente,
para diminuir novos custos de produção. As formas históricas
originárias, nas quais o capital aparece ao começo esporádica ou
localmente,
junto
aos antigos modo de produção, mas destruindo-os cada vez mais por
todas partes, incluem por um lado a verdadeira
manufatura
(ainda não fábrica); esta surge ali onde produz a massa para a
exportação, para o mercado externo, ou seja, sobra a
base do grande comércio marítimo
e
terrestre,
nos empórios deste, tais como as cidades italianas, Constantinopla,
as cidades de Flandres, as holandesas, algumas espanholas, como
Barcelona, etc. Em um começo, a manufatura não submete à chamada
industria
urbana,
mas à indústria
camponesa acessória
, fiação, tecelagem, ao trabalho que requer em menor grau
habilidade artesanal corporativa, formação artística artesanal.
Fora daqueles grandes empórios, onde a produção existe já baseada
em um mercado externo
e está, em consequência, orientada naturalmente,
por assim dizê-lo, para o valor de troca - há ali então
manufaturas conectadas diretamente com a navegação, as construções
navais mesmas, etc. -, esta se instala primeiramente não nas cidades
mas no campo, nas aldeias não corporativas, etc. A industria
camponesa acessória contém a ampla base da manufatura, enquanto que
a industria urbana requer um maior progresso da produção para poder
ser levada a cabo dentro de um organização fabril. O mesmo ocorre
com os ramos tais como da produção como fábricas de vidro, de
metal, serrarias, etc. que desde um princípio requerem maior
concentração de forças de trabalho, que desde um principio
utilizam mais forças naturais, requerem produção em massa e,
igualmente, concentração dos meios de trabalho, etc. O mesmo, com
as fabricas de papel, etc. Por outro lado, o surgimento do
arrendatário e a transformação da população agrícola em
diaristas livres. Ainda que esta transformação só mais tardiamente
se impõe no campo até suas últimas consequências e em sua forma
mais pura, começa ali mais cedo. os antigos, que nunca saíram da
indústria propriamente urbana, nunca puderam por isso chegar à
grande indústria. O primeiro pressuposto desta é a produção não
de valores de uso , mas de valores de troca. as fábricas de vidro,
as fábricas de papel, os estabelecimentos siderúrgicos, etc., não
podem organizar-se em forma corporativa. requerem a produção em
massa, a venda em um mercado geral, patrimônio-dinheiro
por
parte do empresário: não porque ele cria as condições subjetivas
ou objetivas, mas porque soba as antigas relações não podem ser
combinadas. A dissolução das relações de servidão, assim como o
surgimento da manufatura, transformam logo cada vez mais todos os
ramos do trabalho em ramos movidos pelo capital. por certo, em seus
peões e diaristas alheios às corporações, as cidades mesmas
também contêm um elemento para a formação do trabalho assalariado
propriamente dito.
4qui debent censum de capite. O adjetivo "capitales" não pode traduzir-se de outro modo senão só como " aqueles que pagam a contribuição por cabeça"
5Reddan de meo proprio decimas Deo tam in Vivente Capiral, quam im motuis fructibus terrae.
Se , como vimos , a transformação do dinheiro em capital supõe um processo histórico, que separou as condições objetivas do trabalho, que as atomizou contra os trabalhadores, por outra parte, o defeito do capital, uma vez que ele já surgiu, e seu processo consistem em submeter toda a produção e em desenvolver e estender por todas as partes a separação entre trabalho e propriedade, entre o trabalho e as condições objetivas do trabalho. Se verá no desenvolvimento posterior como o capital aniquila o trabalho artesanal, a pequena propriedade da terra na qual o proprietário trabalha, etc., e a si mesmo naquelas formas em que nãoaparece em oposição ao trabalho, no pequeno capital e nas espécies intermediárias híbridas, situadas entre os modos de produção antigos (ou as formas que estes assumam como resultado de sua renovação sobre a base do capital) e o modo de produção clássico, adequado, do capital mesmo.
A única acumulação pressuposta na gênese do capital é a dopatrimônio-dinheiro, que considerado em e por si mesmo e inteiramente improdutivo, enquanto dó surge da circulação e só a ela pertence. O capital se forma rapidamente em mercado interno por meio da aniquilação de toda industria camponesa acessória e assim fia e tece para todos, a todos veste, etc., em suma, outorga a forma de valores de troca à todas as mercadorias antes criadas como valores de uso imediato, um processo que se deriva por si mesmo da separação dos trabalhadores com relação ao solo e à propriedade (ainda quando seja sob a forma servil) das condições de produção.
No caso da artesania urbana, por mais que esteja essencialmente baseada sobre o intercâmbio e a criação de valores de troca, o objetivo fundamental imediato desta produção é a subsistência como artesão, como mestre artesão, em consequência o valor de uso, não o enriquecimento,não o valor de troca como valor de troca. Por isso, em todas as partes a produção está subordinada a um consumo pressuposto, a oferta está subordinada à demanda e se amplia só lentamente.
A produção de capitalistas e trabalhadores assalariados é então um produto fundamental do processo de valorização do capital.A economia usual, que só tem em vista as coisas produzidas, se esquece disto por completo. Enquanto neste processo o trabalho objetivado é posto ao mesmo tempo como não-objetividadedo trabalhador, como objetividade de um subjetividade contraposta ao trabalhador, como propriedadede uma vontade alheia a ele, o capital é ao mesmo tempo necessariamente ocapitalistae a ideia de alguns socialistas de que necessitamos o capital, mas não os capitalistas, é inteiramente falsa. No conceito do capital está posto que as condições objetivas do trabalho - e essas são o próprio produto do capital - assumam frete a este umapersonalidadeou, o que é o mesmo, que sejam postas como propriedade de uma personalidade alheia. No conceito de capital está contido o capitalista. Contudo, este erro não é de nenhum modo maior que o de todos os filólogos, por exemplo, que falam de capitalna Antiguidade, de capitalistas romanos, gregos. Isso é só outro modo de dizer que em Roma e Grécia o trabalho era livre, o que dificilmente estes senhores estariam dispostos a afirmar. O que aos donos de plantações na América não só os chamemos agora capitalistas, mas que o sejam, se baseia no fato de que eles existem como anomalia dentro de um mercado mundial baseado no trabalho livre. Se se tratasse da palavra capital , que não aparece entre os antigos1as hordas que ainda vagam com suas manadas pelas estepes da Asia setentrional seriam os maiores capitalistas, pois originariamente capital significa gado, pelo qual o contrato de meia que , por efeito da falta de capital, é ainda frequentemente celebrado no Sul da frança se chama precisa e excepcionalmente bail de bestes à cheptel2.Se nos aventurarmos em um mal latin, nossos capitalistas ou capitales hominesseriam aqueles "que pagam uma contribuição por cabeça, uma capitação"3
Na determinação do conceito de capital se apresentam dificuldades que não existem no caso do dinheiro: o capitalé essencialmente ocapitalista, mas ao mesmo tempo, é, simultaneamente, capital enquanto elemento diferente do capitalista ou seja enquanto produção em geral. Assim, encontraremos mais adiante que sob o capitalse subsomem muitos elementos que, de acordo com seu conceito, não parecem entrar dentro dele. O capital se empresta, por exemplo. Se o acumula, etc. Em todas estas descrições parece ser uma mera coisa e coincidir completamente com a matéria em que consiste. Mas isto e outras coisas se aclararam no curso do desenvolvimento do tema. (Notemos ao passar e por diversão o que segue: o bom Adam Müller, que toma muito miticamente toas as maneiras figuradas de falar, ouviu mencionar na vida corrente o capital viventeem contraposição com o capital morto e cobriu este de atavios teosóficos. O Rei Ethelstan o poderia ter ensinado a respeito: "De meus recursos devolverei a décima parte a Deus, tanto em Vivente Capital (gado vivo) quanto em frutos mortos da terra."4O dinheiro permanece sempre como a mesma forma no mesmo substrato e por isso é fácil que se o conceba como mera coisa. Ma uma mesma coisa , mercadoria, dinheiro, etc., pode representar capital ou rédito, etc. De tal modo, resulta claro inclusive para os economistas que o dinheiro não é algo tangível , mas que a mesma coisa pode ser subsumida já sob a determinação do capital, já sob outra determinação contraposta e que de acordo com isto é ou não écapital. É, então, manifestamente uma relação e só pode ser uma relação de produção.
Vimos como a verdadeira natureza do capital só se faz presente ao final dosegundo ciclo. O que agora temos que considerar é o ciclomesmo ou a rotação do capital.Originariamente a produção parecia estar para alem da circulação e a circulação para além da produção. O ciclo do capital - a circulação se rebaixou à uma mera aparência, ao igual que o-estar-mais-além da produção.
1Ainda que entre os gregos à principalis summa rei creditae.
3qui debent censum de capite. O adjetivo "capitales" não pode traduzir-se de outro modo senão só como " aqueles que pagam a contribuição por cabeça"
4Reddan de meo proprio decimas Deo tam in Vivente Capiral, quam im motuis fructibus terrae.
Nenhum comentário:
Postar um comentário